Começa neste sábado (30) mais uma daquelas decisões de Gauchão em que existe o claro desafiante e o claro favorito. No roteiro tão conhecido, o gigante começa jogando fora de casa e decide na frente de mais de 50 mil pessoas. Pela lógica, sagra-se campeão com duas vitórias. Ou um empate fora com vitória confortável em casa. Ou uma derrota escassa de visitante e uma vitória com goleada de anfitrião.
Esta sinopse já foi realidade inclusive em outros Juventude x Grêmio. Nas três vezes em que decidiram o campeonato, o Tricolor levou o título com cinco vitórias e um empate nas seis partidas dos mata-matas. A mais acachapante diferença aconteceu em 1996. O técnico gremista era Luiz Felipe Scolari, o Grêmio fez 3 a 0 no Alfredo Jaconi e 4 a 0 no Olímpico.
Cinco anos depois, aquele timaço dirigido por Tite, campeão da Copa do Brasil no Morumbi contra o Corinthians, também venceria os dois confrontos finais. Em 2007, o 3 a 3 em Caxias do Sul foi revirado num 4 a 1 indiscutível do time de Mano Menezes.
Os números, porém, só apontam uma diferença técnica histórica, fruto da enorme diferença de capacidade de investimento entre os dois. Os números não têm valor sobre o presente. Há pontos em comum daquelas finais com esta que começa às 16h30min deste sábado na RBS TV. O Grêmio, de novo, tem melhor time, elenco, joga a segunda partida em casa. De 1996 para cá, não houve inversão de tamanho dos clubes. O Ju não se capitalizou para virar candidato aos títulos mais expressivos do país, o Grêmio não empobreceu a ponto de jogar todos os anos para não cair à Série B.
Treinadores
O que precisa ir para o caldeirão de onde se pretenda tirar análise desta decisão são as diferenças. O clube da Serra tem um Roger Machado renascido da descrença que os resultados da fase classificatória geraram em sua torcida. O treinador foi cirúrgico no enfrentamento com Eduardo Coudet, ganhou os dois duelos táticos. Roger encontrou uma formação inicial que é modificada de acordo com o que o jogo vai exigindo. Refez a titularidade de Lucas Barbosa, formatou o time para atuar em função de Gilberto e destinou missão estratégica a Nenê quando entra faltando 20 minutos. Afirmou um primeiro volante de excelência, Caíque, e encontrou regularidade em sua produção.
Depois de quase ser demitido (provavelmente seria se não tivesse vencido o Guarany em Bagé nas quartas de final), Roger retribuiu a firmeza da direção em mantê-lo com a classificação sobre o Inter e uma confiança renovada dos jaconeros.
Se Roger passou por nem tão poucas ou boas nos primeiros meses do ano, Renato Portaluppi não viveu dias excepcionalmente melhores. Ele nunca teve o risco de não se classificar além da primeira fase, o que não impediu a torcida gremista de se preocupar seriamente em caso de enfrentamento com o maior rival, que contratava um reforço por lance e outro por sorteio no cotidiano do Gauchão.
O Gre-Nal do Beira-Rio aconteceu num contexto em que se assinaria por um empate para evitar danos maiores. Ainda não havia sido afirmado o trio ofensivo que se tornaria o principal setor do time logo após o clássico. Pavon, Diego Costa e Gustavo Nunes configuraram um ataque de respeito para quem tinha perdido o goleador Luisito Suárez.
Esquemas
O Grêmio, aliás, começa da frente para trás e não de trás para frente como gosta a maioria dos treinadores. É aqui que entra um elogio específico e justo ao trabalho de campo de Renato. Foi tateando em busca da melhor formação na fase mais fria do campeonato, se atrapalhou, acertou, atrapalhou-se de novo até que, tendo os três atacantes, bancou sua convicção no mesmo meio-campo do Brasileirão do ano passado.
Villasanti, Pepê e Cristaldo foram sustentados pela convicção de Renato até que o argentino naturalizado paraguaio, por exemplo, tomasse consciência do que se esperava dele e passasse a ser o protagonista que o setor necessitava. Se a defesa ainda não está protegida o suficiente, os sinais de mais um ótimo trabalho do técnico gremista são de que também esta parte do time vai melhorar.
Se Roger renasceu no Juventude, não vale dizer o mesmo de Renato porque o técnico do gigante nunca viveu turbulência tão grande em 2024, nem mesmo depois da derrota no clássico. Na verdade, o que o maior ídolo da história tricolor está fazendo nada mais é do que exercer sua majestade com carisma e competência.
A eliminação do Inter tornou menores todos os episódios discutíveis de quebra de hierarquia e entrevistas atravessadas. Renato está na final com um time que vive seu melhor momento justamente na hora mais importante do Gauchão.
Nada é mais relevante do que isso.