Se uma empresa anunciou já ter começado a busca de petróleo no litoral gaúcho, outra vem logo atrás. A norueguesa TGS planeja começar a produzir uma pesquisa sísmica 3D da Bacia de Pelotas nos primeiros meses de 2025. Nesta entrevista à coluna, João Corrêa, representante da companhia no Brasil, detalha os processos para chegar até a descoberta de petróleo no litoral gaúcho. E avisa que a abundância de óleo pode ser ainda maior do que a expectativa estimada em leilão de blocos em dezembro passado.
Que estudo a TGS já fez na Bacia de Pelotas?
A TGS opera na Bacia de Pelotas desde 2014. O primeiro projeto que se faz normalmente é de sísmica 2D, que é mais simples, com navio de porte médio que traz um cabo flexível de até 12 quilômetros de comprimento. Dentro do cabo tem hidrofones, que são sensores que captam o som. O navio também arrasta um dispositivo que emite som, formando uma bolha que penetra nas camadas da superfície e volta. É como se fosse o ultrassom humano, uma radiografia da Terra. É o primeiro processo da etapa exploratória, quando ainda não se tem certeza de existência. Só a perfuração comprova. O trabalho inicial que fazemos é justamente identificar locais potenciais para uma futura perfuração.
Quais as licenças necessárias?
Para operar, qualquer empresa de sísmica, que a ANP (Agência Nacional do Petróleo) classifica como EAD, Empresa de Aquisição de Dados, precisa ter registro e provar sua capacitação técnica à agência. E cada projeto em específico tem de aplicar no Ibama uma FCA, que é a Ficha de Caracterização de Atividade. O Ibama retorna com um termo de referência, pedindo um estudo da área em que a empresa vai operar, se tem pássaros, migração de tartarugas ou baleias. A partir desse estudo, o Ibama avalia a sensibilidade e emite uma licença com condicionantes. Então, hoje a TGS faz bastante pesquisa ambiental, com universidades. Temos parceria com Furg e UFSC. É uma maneira interessante de fortalecer as instituições. A sísmica é uma das responsáveis pela pesquisa ambiental no país.
Como escolhem os locais para a sísmica?
Vou voltar para 2013, quando a TGS olhou para a Bacia de Pelotas e viu uma bacia de magnitude, mas com pouca exploração. Não havia exploração no lado equivalente, a Namíbia. Começamos fazendo linhas espaçadas para tentar uma vista macro da Bacia de Pelotas. É um estudo de reconhecimento. Enviamos os dados à ANP, porque toda informação vai para a União, é regra. Vimos que havia situações interessantes. Fizemos uma segunda campanha adensando a malha 2D em 2017. Em 2019, fizemos uma terceira. Hoje, temos uma malha 2D bastante regular. Foi com base nesses dados que a ANP desenhou os blocos na Bacia de Pelotas. A Bacia de Pelotas era o patinho feio, agora está com gás.
Qual o próximo passo?
Nós e outras empresas estamos aplicando para o passo seguinte, que é a sísmica 3D. Estamos no pedido de licenciamento. Na sexta-feira (30 de agosto), o Ibama validou os estudos entregues por todas as empresas. Fizemos nosso estudo com a Furg. Os projetos ambientais que a indústria vai fazer na Bacia de Pelotas devem ser de US$ 30 milhões (cerca de R$ 168 milhões na cotação atual). O valor envolve equipamentos importados, alocação de embarcações, manutenção de pessoal. O benefício que trazemos vem antes de aparecer um poço furado, óleo saindo. Ou seja, mesmo se der errado, já deu certo para o Estado. Esse investimento é feito por conta e risco de cada empresa, em regime que se chama multi-cliente, em que o dado adquirido e processado pode ser cedido por um período de 15 anos. Após a data de expiração, viram públicos. A regulação brasileira ainda permite outra modalidade para adquirir dados sísmicos. A empresa que tem a concessão também pode fazer, com licenciamento da ANP e do Ibama.
O que falta para começar a sísmica 3D da TGS?
Entregamos a FCA. O Ibama desenvolveu um termo de referência e pediu um estudo. Entregamos há três ou quatro meses. Na sexta-feira (30), o Ibama afirmou que, sem julgar valor e conteúdo, reconhece que a empresa atendeu a todos os requisitos pedidos. É um primeiro passo. Agora, o Ibama começa a se debruçar, ler os estudos, verificar. Podem emitir parecer técnico, pedir detalhamento. Vamos convergir até o ponto que o Ibama se sentir satisfeito. Depois, sai a licença.
O estudo seria mais na parte ao sul ou ao norte da Bacia de Pelotas?
O que posso dizer da TGS é que estamos com pedido de licença em toda a bacia, cobrimos praticamente 100%. Lógico que não vamos fazer 100% da bacia de uma vez só, porque levaria anos. Vamos focar logicamente naqueles blocos em que nossos clientes apontaram interesse. Mas sem esquecer de que a ANP tem um expediente em que você pode dizer 'olha, vi aqui uma área com potencial exploratório'. E a ANP acaba depois colocando bloco. Identificamos várias áreas com potencial exploratório em que não há blocos ainda, mas que estamos sugerindo a criação, o que aumentaria a atratividade da bacia.
E quando começaria a sísmica 3D na Bacia de Pelotas?
Espero começar a trabalhar no primeiro trimestre ou no início do segundo trimestre de 2025.
Tem previsão de quando vai acabar?
A gente sabe quando começa, mas não sabe quando acaba. Em caso de insucesso, de que ninguém descubra nada, vai levar cerca de 10 anos para dizer que a bacia não tem nada. Como achamos que não é isso que vai acontecer, vão haver descobertas, algumas pequenas, algumas maiores, são 30 anos de produção. Nossos tempos são longos.
Mas quando as empresas já podem começar a adquirir esses dados sísmicos?
Logo que começamos, as empresas começam a comprar, só que não recebem o dado na hora. Temos modelos de negócio de quem entra primeiro paga menos e quem vai entrando mais para o final paga mais. Para entregar um dado de qualidade, diria que demora até dois anos. E depois de começar a sísmica, vão mais três ou cinco anos até o anúncio do primeiro poço.
*Colaborou João Pedro Cecchini