No último dia útil de junho, o dólar fechou com alta de 1,46%, em R$ 5,588. Faltou pouco mais de um centavo para a cotação quebrar a quarta barreira sucessiva em um mês em que acumulou aumento de 6,8%.
Só em junho, o dólar ultrapassou três marcas psicológicas: as de R$ 5,30, R$ 5,40 e R$ 5,50. E a de R$ 5,20 havia sido quebrada só em 29 de maio, porque até o final do mês passado estava no nível de R$ 5.10.
E o calendário vira sob o mesmo bombardeio verbal que marcou o mês. Em entrevista à rádio Tempo, de Belo Horizonte, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou ao ataque, depois de uma pausa na véspera. E afirmou:
— A taxa de juro de 10,5% é irreal para uma inflação de 4%. Não sou do Conselho Monetário Nacional, eu não sou diretor do Banco Central. Isso vai poder melhorar quando eu puder indicar o presidente, que vai para o Senado, e a gente vai construir uma nova filosofia.
Por sua vez, em entrevista publicada na edição desta sexta-feira (28) do jornal Valor Econômico, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, contra-ataca:
— Quando você tem uma pessoa da importância do presidente questionando aspectos técnicos da decisão do BC, gera um prêmio de risco na frente. Então, de certa forma, (...) impacta o canal de transmissão de política monetária.
O que Lula sugere é que, a partir de 1º de janeiro de 2025, quando terá o seu indicado na presidência do BC, a instituição vai atuar de forma diferente. Campos Neto, por sua vez, coloca parte do juro alto criticado pelo presidente na conta do próprio Lula. Não está errado, especialmente nos últimos dias. Mas não é só esse conturbado cenário doméstico que está pressionando o câmbio - que tem reagido pior do que a bolsa.
Virtual substituto de Campos Neto, o diretor de política econômica do BC, Gabriel Galípolo, fez uma interpretação dos últimos dias para um grupo de estudantes:
—O BC é sempre o cara aquele cara na festa que está pedindo para baixar o som, para o pessoal tomar cuidado com a bebida, acaba sendo um pouco o chato da festa. Quando todo mundo está comemorando uma notícia que é superbenigna, do ponto de vista da sociedade ,a economia está crescendo mais, tem mais gente com emprego, mais gente com renda, a função da autoridade monetária é zelar pela inflação.
Galípolo se refere ao fato de o maior crescimento do PIB e a redução do desemprego, como a anunciada na quarta-feira (26) pelo IBGE. O mercado reage mal a esse tipo de boa notícia por ver maior risco para a inflação e, em consequência, mais tempo com juro alto.
Os fatores de pressão no mercado
Falta de perspectiva do início de cortes de juro nos EUA: a taxa alta lá e mais baixa aqui diminui a atratividade de investimentos no mercado financeiro no Brasil, e investidores resgatam aplicações aqui para migrar para mercados mais lucrativos.
Ajuste fiscal: a decisão do governo Lula de reduzir o déficit primário (despesas maiores que receitas antes do pagamento da dívida) só com aumento de arrecadação, sem corte de gastos, é considerada frágil e difícil de manter ao longo dos quatro anos de mandato. A recente ajuda ao Rio Grande do Sul, que eleva os gastos, contribui com essa percepção. Sinalizações de cortes de gastos nos últimos dias chegaram a proporcionar algum alívio, mas não duradouro.
Conflitos e eleições pelo mundo: conflitos entre Rússia e Ucrânia e entre Israel e Hammas elevam incertezas, assim como as eleições para o Parlamento Europeu, que geraram antecipação de pleitos em vários países, inclusive na França, "sócio-fundador" da União Europeia, com risco potencial para a existência do bloco.