Era para ser um dia tranquilo no mercado financeiro, com a inflação medida pelo IPCA-15 de junho abaixo do período anterior e das expectativas. Mas uma entrevista concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou o rumo: o dólar já abriu em alta, rompendo nova barreira psicológica, agora a de R$ 5,50, chegou a perder esse patamar mas fechou com alta de 1,2%, em R$ 5,519.
A frase que soou mais pontiaguda nos ouvidos de analistas foi esta:
— O problema não é ter de cortar, é saber se precisa efetivamente cortar ou se precisa aumentar a arrecadação.
Depois dos acenos dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, de que haveria avanço em corte de gastos, a declaração soou como um questionamento a essa iniciativa.
Contribuiu para essa percepção a negativa de Lula de que poderia desvincular do salário mínimo desembolsos sociais, como o Benefício de Prestação Continuada (BCP). Como Haddad e Tebet haviam descartado a possibilidade de desindexar as aposentadorias, era uma possibilidade de redução de custo pequena, mas viável. O presidente barrou.
E justo nesta quarta-feira (26), o Tesouro Nacional informou déficit de R$ 61 bilhões nas contas do governo central em maio. É o segundo pior resultado para o mês na série histórica, só atrás de maio de 2020, quando a covid-19 provocou rombo difícil de bater, de 165 bilhões.
Esse resultado acentuou especulações de que, no próximo relatório fiscal, o governo seja obrigado a contingenciar o orçamento ou a criar alguma nova exceção às regras, que seriam vistas como artificialismos.
Os fatores de pressão no mercado
Falta de perspectiva do início de cortes de juro nos EUA: a taxa alta lá e mais baixa aqui diminui a atratividade de investimentos no mercado financeiro no Brasil, e investidores resgatam aplicações aqui para migrar para mercados mais lucrativos.
Ajuste fiscal: a decisão do governo Lula de reduzir o déficit primário (despesas maiores que receitas antes do pagamento da dívida) só com aumento de arrecadação, sem corte de gastos, é considerada frágil e difícil de manter ao longo dos quatro anos de mandato. A recente ajuda ao Rio Grande do Sul, que eleva os gastos, contribui com essa percepção. Sinalizações de cortes de gastos nos últimos dias chegaram a proporcionar algum alívio, mas não duradouro.
Conflitos e eleições pelo mundo: conflitos entre Rússia e Ucrânia e entre Israel e Hammas elevam incertezas, assim como as eleições para o Parlamento Europeu, que geraram antecipação de pleitos em vários países, inclusive na França, "sócio-fundador" da União Europeia, com risco potencial para a existência do bloco.