Se um diagnóstico é consenso no governo federal, no estadual, nas empresas e nas universidades é que a reconstrução do Rio Grande do Sul depois da tragédia de maio de 2024 é uma oportunidade para melhorar a condição do Estado.
No entanto, esse conceito não pode ser distorcido ao ponto de virar oportunismo diante da dimensão do drama humano que atinge milhares de pessoas, de perdas de familiares, amigos e vizinhos, da memória de vidas e da percepção de pertencimento a comunidades.
Crime não é só saquear propriedades alagadas ou aproveitar-se da vulnerabilidade das pessoas em abrigos. Também é tirar proveito ilegítimo nesse momento em busca de ganhos robustos e fáceis em grande escala.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na segunda-feira (20) que recuperar o Rio Grande do Sul é uma "possibilidade de fazer a nossa economia crescer mais ainda" e de se "tentar fazer a coisa certa" em relação ao cuidado ambiental até agora fora das prioridades dos governos federal, estadual e municipais.
No mesmo dia, o governador Eduardo Leite afirmou, no programa Roda Viva, da TV Cultura, que o Estado será "um case (exemplo) para o Brasil de reconstrução, de resiliência" e avisou que a reconstrução "tem de ser diferente, que olhe justamente para o futuro e para a adaptação climática".
À coluna, o professor da Faculdade de Economia da UFRGS André Cunha, porta-voz de um manifesto da instituição sobre a reconstrução do Estado afirmou:
— Há uma possibilidade de transformar uma situação caótica em oportunidade de investimento e de transformação de infraestrutura. É uma oportunidade de repensar o crescimento de longo prazo, gerar ganhos de produtividade ao incluir novos setores na estrutura produtiva. Na universidade, trabalhamos com esses temas há algum tempo, por isso tivemos capacidade de produzir rapidamente recomendações ao Estado e aos municípios. Mas se fizermos mais do mesmo, não vai dar muito certo. Precisamos renovar para ter uma economia mais resiliente, mais sólida.
Para que isso se concretize, a agenda da reconstrução não pode ser capturada por interesses individuais, setoriais, empresariais, eleitorais e mesmo acadêmicos. Até os professores universitários frisam que o setor público - não o governo de plantão, que passa - deve se apropriar do conhecimento necessário para desenvolver resiliência, independentemente até das universidades. E precisa, enfim, dar prioridade ao que todos sabem que é preciso ser feito, na pior das hipóteses, desde o severo evento climático de 2016.
Nesse sentido, a pandemia foi uma escola: momentos dramáticos expõem o melhor e o pior de todos. Os que têm vocação para ajudar e a se autoaprimorar vão por esse caminho, quem atua em outro registro atrapalha e piora o ambiente para os outros e para si mesmo.
Agora, quando centenas de voluntários - alguns dos quais também perderam tudo, menos a dignidade - procuram ajudar, aqui e ali aparecem oportunistas fazendo especulação, buscando uma situação melhor para si próprios, não para a comunidade.
PARA LEMBRAR: ainda há emergências a atender e uma reconstrução desafiadora pela frente, para as quais será necessária toda a ajuda disponível e mobilizável, por menor que seja. Se for grande, melhor ainda. Se puder, por favor, contribua. Saiba como clicando aqui.