Embora se saiba muito sobre o fogo que frita o presidente da Petrobras, Jean Paulo Prates, é mais difícil identificar com segurança a origem do combustível. Falta transparência nessa discussão que envolve o presidente da República, ministros palacianos e, em momento inusual no universo corporativo, mas menos na maior companhia do país, até integrantes do conselho de administração da estatal.
A parte visível do embate, como a coluna já caracterizou, é kafkiana, ou seja, absurda: quando saiu o resultado do quarto trimestre de 2023, com R$ 43,9 bilhões só em dividendos (parte do lucro "dividida" com os acionistas) extras, Prates queria distribuir metade desse valor. Foi barrado por iniciativa do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa.
Isso custou à estatal uma perda de valor de mercado (cotação das ações, multiplicada pelo número) de R$ 63 bilhões. Até agora, parte foi recuperada, parte não. Na semana passada, surgiu a informação de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teria convencido os dois colegas da necessidade de "dividir" essa parte do lucro com todos os acionistas, inclusive a União - o que até agora não está confirmado oficialmente.
Outra "informação" que apareceu foi a de que o atual presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, teria sido cotado para substituir Prates. No final de semana, uma reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com os principais interessados chegou a ser marcada, mas foi cancelada porque virou de conhecimento público.
Nesta segunda-feira (8), ao ser perguntado sobre o interesse na parte dos dividendos que cabe à União, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi elegante mas claro:
— Quem tem que decidir (sobre dividendos) é a Petrobras. Isso está bem encaminhado. Temos levando muitas informações ao presidente sobre a situação do caixa da Petobras. Para que o presidente possa ter tranquilidade de que o plano de investimento não será prejudicado por falta do financeiro.
A "informação" de Mercadante teve um efeito curioso no debate. Agora, no Ministério de Minas e Energia já não parece tão essencial a saída de Prates. Bastaria uma espécie de TAC, um termo de ajustamento de conduta, para uma convivência pacífica. A explicação para a mudança seria o temor de que Mercadante na presidência - no conselho ou como executivo - representaria o afastamento de qualquer outra influência na estatal, dada sua proximidade com Lula.
No mercado, a ida de Mercadante provoca temor, porque o atual presidente do BNDES é visto como representante da chamada "ala desenvolvimentista" do governo, que não hesitaria em usar a Petrobras para os objetivos de governo, não de país. No entanto, Mercadante tem procurado demonstrar que não é mais assim, nem no BNDES. Ao falar em retomada da construção naval, foi um dos raros integrantes do governo a reconhecer "erros do passado". Com fogo alto mas fonte do combustível não 100% identificada, tudo pode acontecer na Petrobras. Ou nada.
Leia mais na coluna de Marta Sfredo