Foi em um comunicado gravado - sem direito a perguntas e esclarecimentos - e com atraso de duas horas que o ministro da Economia da Argentina, Luis "Toto" Caputo confirmou a maior parte das já esperadas medidas drásticas no seu "pacote de urgência econômica" (veja a lista no final deste texto).
Apesar do impacto mais direto ser o da megadesvalorização - como foi chamada no país - que leva o dólar oficial de 400 pesos para 800 pesos, outras providências drásticas compõem o ajuste de 5% do PIB, o que significa US$ 25 bilhões.
— Vamos "sincerar" a taxa de câmbio oficial: será de 800 pesos — afirmou Caputo, confirmando as especulações dos últimos dias.
Foi a concretização da parte mais dura - e sincera - do discurso de posse do novo presidente, Javier Milei: no curto prazo, a situação vai piorar. Caputo repetiu Como tanto Milei quanto Caputo vinham sinalizando o caminho, o anúncio veio precedido de uma corrida aos supermercados e de movimentos de mercado que levaram o dólar para mais perto do anunciado.
Ainda antes das medidas, o preço da carne aumentou entre 30% e 35%, gerando comentários de que vai se transformar em "lingotes de ouro" justo antes do Natal. Isso se deve ao fim dos programas de controle de preços, que representavam custos aos cofres públicos que Milei quer cortar. Outra despesa cortada será a feita em forma de subsídios a contas de luz e gás dos consumidores.
— Vamos reduzir os subsídios à energia e ao transporte. O governo passado sustentou preços baixíssimos com subsídios. Engana a população dizendo que põe dinheiro no bolso. Mas não diz que vai cobrar, depois, em aumento da inflação.
Como o impacto social das medidas é dramático, Caputo preparou um sopro para compensar a fratura: vai elevar as dotações de um programa social destinado às famílias mais pobres da Argentina.
Pela manhã, o porta-voz do governo, Manuel Adorni, anunciou corte de 34% dos cargos de administração direta do governo, em ministérios, secretarias e subsecretarias, e previu redução equivalente nos níveis de direções gerais, nacionais e coordenações.
Durante o dia, houve tentativas de aliviar a tensão pré-anúncio com todo tipo de brincadeira. Nas redes sociais, havia tentativas de antecipar "as medidas de Caputo":
Na Rádio Mitre, uma das mais populares emissoras de notícias da Argentina, a trilha que esperava o anúncio sempre adiado era a canção Resistiré - que encerra o filme Atame, de Pedro Almodovar, cuja letra diz "Resistiré para seguir viviendo, soportaré los golpes y jamás me rendiré". Será necessária extrema resiliência para resistir a um dos maiores programa de ajuste da história da Argentina.
As medidas anunciadas
- Desvalorizar o peso à metade, de 400 para 800 por dólar
- Não renovar os contratos públicos com menos de um ano de prazo
- Suspender por um ano os anúncios do governo
- Redução dos ministérios e dos cargos inferiores em 34% no total
- Não licitar obras públicas e cancelar as já aprovadas que não tenham começado
- Reduzir ao mínimo as transferências do Estado às províncias
- Reduzir os subsídios às tarifas de energia e transporte
- Duplicar dois planos sociais para baixíssima renda, mas manter um terceiro com valores de 2023, ou seja, valerão menos da metade dada a inflação de 140% no ano
- Reformar o sistema de importações (Sira), sem exigir licença prévia
- Depois do fim da "emergência", ou seja, daqui a 18 ou 24 meses, eliminar os impostos sobre a exportação.