Se alguém tinha dúvidas sobre o ritmo e a profundidade do choque que o novo presidente da Argentina, Javier Milei, vai aplicar ao país, as deixou de lado depois do duríssimo discurso de posse, que já fixou até o tamanho da conta: 5% do PIB, ou cortes de US$ 25 bilhões.
As primeiras medidas eram esperadas para esta segunda-feira (10), ainda antes da abertura do mercado, mas foram adiadas para a terça-feira (12), conforme o primeiro comunicado oficial do novo governo feito pelo porta-voz Manuel Adorni.
Antes do discurso "demolidor", como caracterizou a imprensa argentina, já circulavam listas informais das "maldades" - no sentido de que trarão consequências negativas embora tenham sido consideradas pelo novo presidente como "inevitáveis". Sabia-se que viria um choque fiscal, mas o fato de ter sido anunciado formal e publicamente por Milei acrescentou dramaticidade à situação.
O que se espera é uma supermaxidesvalorização - que deverá se precificada pelo mercado ao longo do dia. A perspectiva é de que o dólar oficial e comercial de 400 pesos por dólar para perto de 800 e sejam eliminados, ainda que gradualmente, subsídios que aliviam contas para os consumidores, como as deluz e gás, além do custo do transporte público.
Milei tem argumentos técnicos para adotar essas medidas: são parte das despesas públicas que ajudaram a acelerar o ritmo da inflação no país. Mas entre a existência justificativa político- financeira e o impacto que o conjunto de medidas terá no dia a dia da população, há abismos nos quais a popularidade do novo governo pode escorrer.
Um dos temores que cresceu depois do discurso foi o de um drástico enxugamento do setor público, sobre o qual Milei afirmou que cairá a maior parte do custo do ajuste. Entre as poucas perguntas respondidas pelo porta-voz - segundo ele, porque ainda não tem conhecimento das medidas que serão anunciadas pelo ministro da Economia, Luis "Toto" Caputo - uma foi sobre o futuro dos servidores públicos.
— Nenhum empregado público que aporta valor deve estar preocupado. O privilégio é que exista uma pessoa militante, que não trabalha, e ocupe uma cadeira sustentada inclusive por quem mal tem um prato de comida. Essa é uma decisão firme do presidente Milei: acabar com o emprego político.
Na véspera, o novo presidente editou dois decretos: um corta o número de ministérios pela metade, de 18 para nove - a promessa era ter apenas oito -, outro modifica decreto do ex-presidente Maurício Macri que proibia a indicação de familiares para o governo. Milei nomeou a irmã, que atuou intensamente em sua campanha, como secretária-geral de governo.
Os anúncios esperados
- Proibir o Banco Central de financiar o Tesouro
- Eliminar subsídios nas contas de luz e gás e no transporte público de forma gradual entre janeiro e abril
- Não fazer novas obras públicas, a não ser as que tenham financiamento externo
- Aumentar impostos sobre as importações
- Prorrogar o Orçamento de 2023 para congelar gastos
- Suspender contribuições não reembolsáveis às províncias
- Congelar benefícios orçamentários para empresas privadas
- Congelar o financiamento a universidades aos níveis de 2023
- Liberar preços de combustíveis e pré-pagos
- Reduzir salários públicos
- Transferir as Leliqs (títulos do BCRA) para o Tesouro Nacional
- Transformar empresas públicas em S/As para facilitar a privatização
- Desvalorizar e fixar o dólar comercial em torno de 600 pesos, com imposto adicional de 30% para financiar o programa social Por uma Argentina Inclusiva e Solidária (Pais), o que levaria a cotação efetiva para perto de 800 pesos