Depois de se reunir com Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que as declarações do presidente que azedaram o humor do mercado na sexta-feira (27) surgiram de informações que o presidente havia recebido sobre perdas de arrecadação.
O que Haddad chamou de "ralo de dinheiro" foi provocado por medidas do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) adotadas em 2017, e, passados dois governos, só o atual está disposto a "endereçar" (resolver, em bom português).
Ao repetir várias vezes que a causa da mudança da percepção presidencial sobre a capacidade de atingir a meta fiscal já havia sido citada várias vezes no passado por ele mesmo, Haddad acabou carimbando a manobra como uma fábrica de limonada. Mas útil para tentar matar a sede de arrecadação, porque o ministro da Fazenda construiu uma saída honrosa ao convocar os líderes do Congresso para encontrar a solução.
Também ajudou uma declaração do ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, de "quem apostar na falta de sintonia entre Haddad e Lula vai perder dinheiro". Na sexta-feira (27), depois da desastrada declaração presidencial, surgiram boatos no mercado de que Haddad - visto como fiador do compromisso fiscal do governo - poderia deixar o cargo.
— Meu papel é buscar equilíbrio fiscal. Não é por pressão do mercado ou porque sou ortodoxo. Faço o que acredito, o país precisa olhar para as contas públicas. Não mudei de ideia, mas preciso de apoio político, do Congresso e do Judiciário — afirmou Haddad, na declaração mais esperada do dia.
Enquanto Haddad falava, a bolsa chegou a engatar uma ligeira queda, que ao menos até o final da manhã virou um pequeno "u" no desenho do gráfico do Ibovespa. Em seguida, o indicador se recuperou e passou a trafegar em nível acima ao do anterior à fala do ministro. O mesmo ocorreu com o dólar, no mesmo sentido mas com avaliação inversa: teve pequeno recuo e voltou a subir, mantendo-se acima de R$ 5, como havia fechado na sexta-feira (27).
A tese de Haddad é de que a decisão do Congresso de estender o alcance de estímulos fiscais dos Estados a tributos federais provocou redução na arrecadação de R$ 39 bilhões no primeiro ano de aplicação, mas saltou para R$ 149 bilhões em 2022 e é projetada para R$ 200 bilhões neste ano. Para discutir remédios para essa situação e para a decisão do STF que retirou da base de cálculo do PIS/Cofins o ICMS recolhido pelas empresas, Haddad anunciou reuniões com líderes do Congresso com a presença de Lula.
Impacto nas expectativas
A maioria dos cerca de cem economistas de instituições financeiras e consultorias econômicos elevou levemente a projeção de déficit para 2024 de 0,75% para 0,78%. É verdade que nem chegou ao nível de duas semanas atrás, quando estava em 0,83%, mas já mexeu o ponteiro. Outra mudança pequena, mas eloquente, foi nas projeções de juro básico para o final de 2024, de 9% para 9,25%. Segundo analistas, a principal causa é o cenário externo, mais especificamente nos Estados Unidos, mas a declaração de Lula contribuiu.
É bom lembrar do que se trata esse percentual: é a equivalência do valor do rombo com o PIB, ou seja, com toda a riqueza produzida no país. Embora os indicadores não tenham relação 100% direta - um é só sobre contas públicas, outro é sobre a atividade econômica em geral - é uma medida padrão global para medir o compromisso fiscal de governos.
Atualização: depois de Haddad não se comprometer com a meta de déficit fiscal zero, a bolsa aprofundou a queda, mas mesmo assim, no início da tarde não passa de 1%.