Era para ser anunciado nas "primeiras semanas" do governo Lula. Depois, seria logo depois da Páscoa. Mais tarde, foi preciso esperar pelas definições do novo marco fiscal. Mas já se vão quatro meses e meio e - apesar do pedido "pelo amor de Deus" do presidente -, o Desenrola ainda não desenrolou.
A previsão mais recente era de um anúncio em julho - mas agora até essa data está em xeque, apesar de os índices de inadimplência permanecerem elevados. O que se diz no mercado é que a montagem do programa é mais complexa do que parecia.
Uma das dificuldades seria o acesso aos dados entre as empresas que atuam na gestão dos atrasos, como Serasa e SPC Brasil. As regras de operação dessas atividades, que envolvem dados confidenciais, já eram estritas e ficaram ainda mais depois da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Outra seria a aplicação tecnológica, que estaria levando mais tempo do que o previsto para desenvolvimento.
A previsão é de que o sistema conecte empresas que esperam receber pagamentos em atraso, bancos e startups de crédito e os responsáveis por cadastros de inadimplência. A ideia é que, com essa conexão feita, sejá possível "leiloar" descontos para as dívidas pendentes. O pagamento não seria feito diretamente por quem está devendo, mas por intermediários, de grandes bancos a pequenas fintechs. Ou seja, os recursos não passariam pelos inadimplentes.
Algo igualmente difícil já estaria desenrolado: uma reserva orçamentária de R$ 11 bilhões para compor um fundo garantidor que viabilize a renegociação. Nos cálculos do Ministério da Fazenda, o programa alcançaria cerca de 70 milhões de pessoas, o que corresponde a quase metade da população que trabalha formal ou informalmente no país.
O Desenrola, na época ainda um programa para renegociação de dívidas, foi prometido por Lula ainda no segundo turno da campanha eleitoral, depois de absorver uma medida do adversário Ciro Gomes (PDT). A intenção era permitir que cerca de 80 milhões de pessoas renegociassem dívidas de até R$ 4 mil em atraso. O modelo já evoluiu para o limite de R$ 5 mil para dívidas feitas até o final de dezembro de 2022.
Uma das justificativas é aliviar a situação de quem contraiu dívidas com juro de 2% ao ano, que vigorou de 6 de agosto de 2020 a 18 de março de 2021. A Selic se manteve abaixo de dois dígitos até 3 de fevereiro de 2022, dando a falsa ilusão de "dinheiro barato" que estimulou o endividamento dos brasileiros.