Entre silêncios brasileiros e barulhos argentinos, a criação de um instrumento de liquidação de operações comerciais entre os dois países já ganhou até nome: "Sur", já apelidado de "Sur-Real" (sim, com intenção irônica).
Daí a uma "moeda comum" vai um longo caminho. Aliás, já existe um bom percurso até para criar a alternativa que seria apenas uma solução para a escassez de dólares na Argentina e a decorrente redução nas vendas de empresas brasileiras para os vizinhos.
A coluna já observou que uma moeda comum é virtualmente impossível nesse momento em que o Brasil tem uma muralha de dólares nas reservas do Banco Central, enquanto o pequeno dique da Argentina está cheio de buracos. O problema é que as restrições ao pagamento das importações por parte da Argentina está colocando pressão em uma solução de prazo mais curto.
A coluna registrou, por exemplo, a "alternativa" encontrada pelas montadoras: comprar imóveis na Argentina com pesos para não ter de esperar a liberação em dólares. Aqui, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a se irritar com perguntas sobre o tema. Poderia ter aproveitado a oportunidade para esclarecer.
Em contraste, uma entrevista do ministro da Economia argentino, Sérgio Massa, ao jornal Financial Times, dada às vésperas do encontro, acabou aumentando o volume da polêmica. Foi Massa que "batizou" a moeda e afirmou que teria uma ambição semelhante ao euro, ou seja, de substituir as denominações nacionais no longo prazo.
Foi preciso que o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, desfizesse a confusão, em entrevista concedida no início da tarde à GloboNews: há um desejo de buscar uma moeda comum, não única, sem substituir real ou peso. E avisou foi criado hoje um grupo de trabalho para desenvolver a ideia, cujo objetivo é "poder realizar comércio entre os países e superar a dificuldade de aceitar pesos".
— O comércio entre Brasil e Argentina está constrangido pela indisponibilidade de moeda de um terceiro pais que não participa desse comércio.
Essa era exatamente a expectativa dos empresários gaúchos que acompanham a visita: abertura de caminho para uma solução, que não será de curto prazo, mas que também não pode esperar indefinidamente.
— Queremos suprir a carência que nosso parceiro tem de acesso a divisa (dólares), criando uma linha de crédito em reais, com as devidas garantias para a operação não ficar descasada. É uma operação de mercado tradicional, que exige colaterais, ou seja, garantias exequíveis e liquidáveis — disse Galípolo.
Conforme o secretário-executivo, a linha de crédito em reais será o primeiro passo, que deve alcançar uma etapa posterior, com uma espécie de câmara de compensação (clearing) entre as importações e as exportações de cada país.