Em meados do ano passado, a adoção de novas restrições ao pagamento de importações na Argentina foi vista com cautela pelo presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Márcio de Lima Leite, que só em outubro mencionou que havia "acendido a luz amarela" no setor.
Nesta sexta-feira (6), depois de fazer um balanço de 2022, Lima Leite relatou, em conversa com um pequeno grupo de jornalistas, que montadoras brasileiras estão comprando imóveis na Argentina diante da incerteza do recebimento.
— O governo argentino não está liberando pagamentos, que no caso de veículos acima de US$ 25 mil, só ocorrem depois de 360 dias. Para as empresas que vendem, isso gera um caixa preso na Argentina. Diante da desvalorização do peso e do alto custo do hedge (mecanismo para se proteger de oscilações cambiais), as montadoras estão investindo em real estate (imóveis). Algumas compraram fazendas, outras que alugavam instalações fizeram aquisições, tornaram-se proprietárias. E isso não está acontecendo só no setor automotivo, empresas de outros segmentos estão fazendo o mesmo - testemunhou o presidente da Anfavea.
Conforme Lima Leite, essa "solução" era de certa forma desejada pela Argentina, porque representa investimento externo no país. Observou, ainda, que o governo do país hermano havia sinalizado, em meados do ano passado, que o problema seria temporário, porque havia uma conta pesada de energia elétrica para quitar. No entanto, passados seis meses, nada mudou:
— Em vez de melhorar, a situação se agravou. Estamos acompanhando de perto, com lupa, e pedindo que o governo brasileiro interceda para buscar alguma normalização.
A coluna aproveitou a conversa para atualizar a busca da Anfavea, com outras entidades, de investidores em semicondutores no Brasil. Conforme Lima Leite, atualmente o cenário é de "um pouco mais de tranquilidade", com previsão de normalização para o segundo semestre deste ano.
— O governo anterior estava com a MP pronta, já havia passado pelo Ministério da Economia, mas o ministro Guedes nos disse que achou por bem passar para a equipe de transição. Não havia divergência, foi só pela questão de momento.
A coluna quis saber se a anunciada decisão de rever a extinção da Ceitec poderia contribuir de alguma forma nesse processo, mas o executivo foi cauteloso:
Vi o nome dessa empresa por diversas vezes desde que começou o trabalho, mas não entramos em nome de empresas. Trabalhamos nas medidas para criar as condições pra investimento, apresentamos o projeto no Japão. Também falamos com a equipe de transição, temos uma nova rodada agendada ainda para janeiro com o ministro Alckmin.
Lima Leite lembrou que, na cerimônia em que assumiu o cargo, o ministro da Indústria e Comércio falou várias vezes em incentivar a produção de semicondutores. A coluna lembra que mencionou também o setor automotivo.
Curiosidade: na conversa, o presidente da Anfavea contou que um executivo de montadora disse que pretende começar a produzir no Brasil, ainda em 2023, veículos híbridos plug-in (que combinam combustível para motor a combustão com possibilidade de ligar na tomada, porque alguns híbridos só carregam a bateria ao rodar).