Mesmo sem o incidente diplomático provocado pelo presidente e candidato a reeleição Jair Bolsonaro (PL), ao afirmar, durante o debate na Band TV, que o presidente do Chile, Gabriel Boric, "praticava atos de tocar fogo em metrôs", as mudanças na Constituição chilena teriam impacto no Brasil.
Agora que o Chile decidiu convocar seu embaixador do Brasil - equivalente a uma luz de alerta nas relações bilaterais -, o potencial de impacto é ainda maior, dada a atenção que o tema passa a ter por aqui.
No próximo domingo (4), os cerca de 15 milhões de eleitores chilenos vão decidir se aprovam ou não o novo conjunto de regras do país elaborado pela chamada Convenção Constitucional formada por 155 pessoas. Até agora, as pesquisas não garantem que o texto será aprovado no plebiscito. Um dos pontos mais visados é a reforma da Previdência, que tem relação com a falta de apoio ao resultado da reforma.
Até agora, a previdência chilena é estritamente privada e funciona no sistema de capitalização, que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou emplacar no Brasil. Na última sexta-feira (26), em Porto Alegre, Guedes lamentou que o dispositivo não tenha sido aprovado no Congresso.
Ainda assim, uma estimativa obtida pela Folha de S.Paulo com base em cálculos de Leonardo Rolim, ex-presidente do INSS no governo Bolsonaro, projeta a economia da União com a reforma da Previdência entre 2020 e 2022 em R$ 156,1 bilhões, 78,8% acima do esperado na época da aprovação das regras (R$ 87,3 bilhões, em valor atualizado pela inflação; leia o texto clicando aqui).
A expectativa era de que a nova Constituição do Chile que irá a plebiscito no domingo (4) alterasse profundamente as regras da Previdência, mas isso não se confirmou. A nova proposta se limita a definir princípios, sem determinar o funcionamento do sistema, nem o futuro das atuais Administradoras de Fundos de Pensão (AFP), que gerenciam a poupança dos chilenos para bancar a aposentadoria. Tudo isso terá de ser definido por lei complementar.
A proposta que vai à apreciação popular só estabelece que a política de seguridade social será financiada por "trabalhadoras, trabalhadores, empregadoras e empregadores, por meio de pagamentos obrigatórios e arrecadações gerais da nação" - ou seja, recursos públicos. Essa é uma novidade, já que desde a década de 1980 a Previdência é bancada apenas com recursos privados, mas não foram definidos percentuais nem formato. Ou seja, não está sinalizado sequer o fim do regime de capitalização.