Em qualquer tempo, a decisão do procurador-geral da República, Augusto Aras, que resultou em pagamentos extras de quase R$ 500 mil a procuradores federais só em dezembro, seria inadequada para um país com salários congelados no serviço público e sem recursos suficientes para atender a todos os brasileiros necessitados.
Em tempo de revolta entre servidores federais, soa como provocação desnecessária e contraproducente, por embutir risco de agravar uma situação já tensa.
Depois de provocar temor no mercado financeiro, a mobilização da terça-feira (18), embora tenha reunido boa parte da elite do funcionalismo, foi considerada pouco ameaçadora. Não foi invisível, mas não alcançou o impacto temido. E até agora, não há sinais de reflexos efetivos na prestação de serviços públicos. Talvez decorra mais da responsabilidade e menos da indignação, mas é o que aparece.
Não, não há ilegalidade em pagamentos de até R$ 446 mil mensais, graças a penduricalhos que garantem a parte da elite do serviço público privilégios como licença-prêmio de três meses a cada cinco anos de trabalho conversíveis em dinheiro e, deboche dos deboches, auxílio-alimentação de R$ 1,8 mil em um mês.
E não, não se trata de inveja, como deve aparecer nos comentários. Esta jornalista teria vergonha de impor semelhante despesa aos contribuintes brasileiros que, neste 2022, terão de descontar 7,5% ao Leão se ganharem mensalmente a partir de R$ 1,903,99, por falta de correção na tabela do Imposto de Renda. É quase o mesmo valor do "auxílio-alimentação".
Para lembrar, a revolta dos servidores virou mobilização com a garantia, no orçamento, de reajuste para apenas três categorias: policiais federais, policiais rodoviários federais e, agora, também a agentes penitenciários. E surgiu porque todo o funcionalismo está com salários congelados ao menos desde o início da pandemia. A decisão de Aras pode realimentar a insatisfação e dar combustível à ameaça de greve em fevereiro.
Na quarta-feira (19), depois que seu governo viu com alívio o resultado das manifestações da véspera, Jair Bolsonaro disse que o aumento prometido "está suspenso" e que que os todos os servidores serão contemplados "com um merecido reajuste" no Orçamento de 2023.
Ainda sem a inflação prevista de 5% para este ano, as categorias já pedem correção de 28% nos salários. A projeção do Instituto Fiscal Independente (IFI) é de que cada ponto percentual corresponde a R$ 4 bilhões extras no orçamento. Falta descobrir de onde Bolsonaro vai tirar cerca de R$ 140 bilhões só para repor a inflação de 2020, 2021 e 2022 e assim, cumprir mais essa promessa.