A novela não terminou: o presidente Jair Bolsonaro sancionou a prorrogação da desoneração da folha de pagamento e, ao anunciar a decisão, a Secretaria-Geral da Presidência afirmou que não havia necessidade de compensar a renúncia fiscal por não representar nova despesa, citando "orientação recente" do Tribunal de Contas da União (TCU).
Agora, porém, o TCU cobra do governo que demonstre, até 31 de janeiro, ter adotado os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), entre os quais está o de não autorizar benefícios tributários sem garantir receita compensatória.
O Palácio do Planalto avalia que o texto da LRF impõe compensação apenas em casos de concessão ou ampliação de benefícios tributários, sem mencionar a palavra prorrogação. No entanto, em julgamento de 2010, o TCU havia decidido que, quando houvesse "prorrogação de renúncias de receitas", deveriam ser observadas as condições estabelecidas no artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Além da polêmica sobre a legalidade da prorrogação, da forma como foi feita, há outra: no último dia do ano, Bolsonaro também acabou com uma renúncia fiscal estimada em R$ 1,5 bilhão anuais para a indústria química. O benefício consistia na redução de alíquotas de PIS e Cofins cobradas de matérias-primas do segmento, como nafta, eteno e butadieno.
Foi outra quebra de acordo, porque, em julho de 2021, o Regime Especial da Indústria Química (Reiq) havia sido prorrogado até 2025. A decisão, tomada por medida provisória, surpreendeu o setor. Estudo encomendado pela Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) à Fundação Getulio Vargas (FGV) pondera que o fim abrupto do Reiq tornaria inviável a operação em parques industriais e poderia provocar cortes de até 85 mil empregos no país, dos quais 9,1 mil no Rio Grande do Sul, além de perda de arrecadação estimada em R$ 3,2 bilhões.
O problema com a fonte
O governo fez acordo para incluir a prorrogação no orçamento de 2022, inclusive para obter votos suficiente para aprovação. No entanto, não foram garantidos recursos para bancar a continuidade da desoneração neste ano. Depois de apresentar cálculo de renúncia fiscal de R$ 8 bilhões, o governo Bolsonaro reestimou a necessidade para algo em torno de R$ 5 bilhões. No orçamento, há previsão de R$ 3,3 bilhões, sob a rubrica genérica "desonerações". Ao anunciar a sanção, a Secretaria-Geral da Presidência afirmou, em nota, que a medida foi adotada "nos termos da orientação emitida pelo Tribunal de Contas da União". Detalhou que "não será necessária nova compensação fiscal" por se tratar de "prorrogação de benefício fiscal já existente" e porque "a medida foi considerada no Relatório de Estimativa de Receita do Projeto de Lei Orçamentária".
Como funciona a desoneração da folha de pagamento
É restrita a 17 setores da economia considerados os que mais concentram geração de mão de obra: calçados, call center, comunicação, confecção/vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, couro, fabricação de veículos e carroçarias, máquinas e equipamentos, proteína animal, têxtil, tecnologia da informação (TI),tecnologia de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, transporte rodoviário coletivo e transporte rodoviário de cargas. As empresas beneficiadas podem optar por uma alíquota de 1% a 4,5% (dependendo do segmento) sobre o faturamento bruto, em vez de descontar 20% sobre o valor total da folha de salários para pagar sua contribuição ao INSS.