O recesso de final de ano está mais tenso para os 17 setores que mais geram emprego no país. Resultado de um imbróglio entre o governo Bolsonaro e o Congresso, a prorrogação da desoneração da folha de pagamento para 2022 ficou sem previsão no orçamento de 2022 e, a dois dias do prazo de extinção do benefício fiscal, seu futuro é incerto.
No Estado, a indústria mais afetada é a calçadista, que calcula aumento de custo de R$ 600 milhões ao ano para o segmento caso a desoneração não seja prorrogada.
Presidente da Abicalçados, Haroldo Ferreira, afirma que não é possível estimar um percentual médio de aumento de custos para o setor, porque existem diferentes percentuais de contribuição. Mas estima aumento de R$ 600 milhões na carga tributária do setor caso a desoneração não seja prorrogada. Em um período em que as indústrias já enfrentam pressão de custos de insumos e matérias-primas, há risco para os empregos dos setores afetados.
A dúvida existe porque, até esta quarta-feira (29), não há solução para cobrir a renúncia fiscal reestimada em cerca de R$ 5 bilhões com a medida. E também porque o Palácio do Planalto trabalha com prazo até 7 de janeiro, embora a desoneração termine oficialmente na sexta-feira (31).
— Estou preocupado com a morosidade da sanção pelo presidente, porém já estive em reunião com ele e o ministro Paulo Guedes no dia 11 de novembro, quando ambos afirmaram que não haveria veto. Em 10 de dezembro, estive novamente em reunião da Coalizão Indústria com Guedes, que reafirmou a continuidade da desoneração para os 17 setores que mais empregam no país — relatou Ferreira à coluna.
Na terça-feira (28), completa o presidente da Abicalçados, fez um novo contato com assessores de Bolsonaro, que confirmaram que haverá sanção. Um dos problemas para esses 17 setores é a insegurança jurídica com a demora na solução. Ferreira reafirma que a desoneração vale até o dia 31, e portanto, a partir daí não se sabe como administrar o custo da folha:
— Caso não seja prorrogada, a folha de janeiro de 2022 seria tributada como os setores não desonerados, mas os custos industriais de mão de obra já estariam mais altos a partir do dia 1º de janeiro.
As empresas recolhem a contribuição para o INSS, reduzida graças à desoneração (leia mais abaixo) até o dia 2 do mês seguinte. Em janeiro, o pagamento que será feito até o dia 3, uma segunda-feira, ainda será sobre a folha desonerada. Em fevereiro, porém, já haveria custo extra caso não haja uma solução.
O problema com a desoneração
O governo fez acordo para incluir a prorrogação no orçamento de 2022, inclusive para obter votos suficiente para aprovação. No entanto, não foram garantidos recursos para bancar a continuidade da desoneração no próximo ano. A causa do imbroglio virou um jogo de empurra: o relator do orçamento, Hugo Leal (MDB-RJ), diz que o Ministério da Economia não mandou ofício requisitando a inclusão, o ministério sustenta que a responsabilidade pela falta é do relator. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já afirmou publicamente que discorda da forma como a desoneração é feita, apenas para esses 17 setores.
Depois de apresentar cálculo de renúncia fiscal de R$ 8 bilhões, o governo Bolsonaro reestimou a necessidade para algo em torno de R$ 5 bilhões. No orçamento, há previsão de apenas R$ 3 bilhões, sob a rubrica genérica "desonerações". Seria preciso garantir que fossem destinadas especificamente à da folha de pagamento, e ainda obter o restante.
Uma saída seria usar esses recursos disponíveis no orçamento e, depois, elaborar um Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) para complementar o valor necessário até o final de 2022.
Como funciona a desoneração da folha de pagamento
É restrita a 17 setores da economia considerados os que mais concentram geração de mão de obra: calçados, call center, comunicação, confecção/vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, couro, fabricação de veículos e carroçarias, máquinas e equipamentos, proteína animal, têxtil, tecnologia da informação (TI),tecnologia de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, transporte rodoviário coletivo e transporte rodoviário de cargas. As empresas beneficiadas podem optar por uma alíquota de 1% a 4,5% (dependendo do segmento) sobre o faturamento bruto, em vez de descontar 20% sobre o valor total da folha de salários para pagar sua contribuição ao INSS.