A essa altura, ninguém ignora que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem certa fixação no tal "imposto sobre transações", como prefere chamar.
Mal começou a mobilização de 17 segmentos para manter a desoneração da folha de pagamento até 2026, já saltou a "solução": criar um imposto com formato semelhante ao da CPMF, mas que não se limita a transações financeiras. É uma espécie de "imposto sobre tudo", que incidiria do pão de queijo a transações digitais.
Guedes não tem simpatia pela desoneração setorial, embora a regra que alivia o peso tributário seja para grandes empregadores. As empresas beneficiadas podem pagar uma alíquota de 1% a 4,5%, dependendo do segmento, sobre o faturamento bruto, em vez de descontar 20% sobre o valor total da folha de salários para pagar sua contribuição ao INSS.
— Os setores que se beneficiam de desoneração, em vez de terem sensibilidade, e apoiar um movimento mais amplo para abaixar para todo mundo, só se preocupam em renovar seu próprio subsídio — reclamou o ministro sobre a mobilização.
Como quer estender o alívio a todos os setores, Guedes autorizou a negociação no Congresso para tentar um novo tributo. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já foi embarcado. Relator do projeto que prorroga a desoneração até 2026, o deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) admite que está buscando apoio empresarial. A tentativa já tem agenda: uma rodada de reuniões de empresários com o governo depois do feriado de Sete de Setembro, para mandar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) na semana seguinte.
— Não se trata de CPMF, nem de aumento de tributos, mas de uma possível substituição de cobrança que amplia a base contributiva e diminui o peso — disse o parlamentar antes de ser interrompido por uma chamada do Ministério da Economia.
Na volta, Goergen sustentou que o setor privado topa um microimposto, que teria alíquota de 0,1% sobre literalmente todas as transações, inclusive as digitais.
— Inclusive sobre a nuvem e o dinheiro sonegado — disse o parlamentar.
A coluna foi checar com o setor privado se de fato há apoio e, surpreendentemente, há. Haroldo Ferreira, presidente da Abicalçados, diz que, para contemplar a exigência de extensão da desoneração para todos os setores, a indústria topa o "microimposto", que substituiria a totalidade da contribuição patronal à Previdência e "praticamente isentaria" a contribuição laboral para os salários mais baixos. Explica que a alíquota de 0,01% seria usada também para cobrar essa fatura.. Para quem ganha salário mínimo, representaria redução da contribuição do trabalhador de cerca de R$ 88 para R$ 1,10.
— Mas a redação da PEC tem de ser explícita, inclusive em relação à alíquota. Não pode aparecer 'com percentual ajustado em lei complementar'. Se a alíquota não estiver fixada na PEC, não apoiamos — disse o empresário.
Ferreira e Goergen reconhecem que passar uma PEC, a essa altura, não é tarefa simples. Ambos dizem que seu principal alvo é a renovação, por ao menos dois anos, da desoneração dos 17 setores, e que só se aventuraram na busca de uma alternativa diante das objeções de Guedes. Mas ambos, que já condenaram enfaticamente a criação de impostos, agora tentam ajudar a colocar um novo em pé.