Ainda que seja a exceção que confirma a regra, existe, sim, um empresário que defende a recriação da CPMF, sem medo nem de usar o nome original. Luigi Nese, vice-presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), não só estimula o ressurgimento do tributo cobrado sobre todas as movimentações financeiras como considera baixa a alíquota de 0,2% que o ministro da Economia, Paulo Guedes, costuma citar. Sua proposta é de cobrar 0,81% em cada transação para, em troca, zerar os encargos sobre a folha de pagamento não só das empresas, mas também reduzir a contribuição dos trabalhadores para o INSS.
Como justifica a defesa da CPMF, tão odiada pelos empresários?
Existe um estigma sobre a CPMF que, em parte, vem da falta de informação e de comunicação. É uma proposta que pode beneficiar muito o setor empresarial. A partir de um estudo encomendado há 20 anos à Fundação Getulio Vargas (FGV), defendemos a cobrança de uma alíquota de 0,81% que substituiria todos os encargos sobre a folha de pagamento. Permitiria criar mais empregos, pagar melhores salários aos trabalhadores e, em consequência, gerar uma relação melhor entre empregado e empregador.
Essa alíquota, muito mais elevada do que propõe o ministro da Economia, é viável?
Sim, porque queremos eliminar todos os encargos das empresas sobre os salários. E, como a cobrança de CPMF vai onerar os assalariados, estamos propondo que seja desse tamanho para permitir, também, a redução na contribuição do trabalhador para a Previdência, dos atuais 8% a 11%, para 5% a 8%. Seria uma forma de compensar o fato de que, ao sacar o dinheiro do salário, o empregado já seja prejudicado pela CPMF. A proposta de 0,2% não serve para nada. Para retirar ao menos a cobrança da contribuição das empresas ao INSS, é preciso que a alíquota seja de ao menos 0,44%. Aí arrecadaria cerca de R$ 200 bilhões para a Previdência e permitiria eliminar a cobrança de 20% sobre a massa salarial que as empresas bancam.
Quando seus pares o questionam sobre essa sua defesa, o que costuma responder?
Sempre digo 'me provem que a proposta está errada'. Temos dados e números que sustentam que é uma boa troca.
Como responde às críticas de que a CPMF é um tributo cumulativo, que provoca distorções na forma de contribuição?
Há vários tributos cumulativos, como esse que o governo está querendo criar para substituir PIS e Cofins. Na verdade, a CPMF promove justiça social. Quem mais movimenta recursos paga mais, quem movimenta menos, paga menos. No estudo, 95% dos setores produtivos saem ganhando. Quem vai perder são os segmentos de capital intensivo, como siderurgia, mineração, petróleo e gás e os bancos. Esse é o grande problema. Há muitos interesses envolvidos. Sonegadores e informais também serão afetados, mas esse é a grande virtude desse imposto: todo mundo que tem conta em banco vai pagar.
Outra questão levantada por técnicos é o fato de esse tipo de tributo ser muito pouco usado em países considerados confiáveis.
É um tributo moderno. Vários países da Europa passaram a estudar. Com a digitalização da economia, há muitos grandes players que não são atingidos pela tributação convencional. É uma forma de cobrar quando alguém paga uma conta para a Google, por exemplo.
O ministro Guedes diz que sua proposta não é recriar a CPMF, mas, no seu caso, o nome é esse mesmo?
Independentemente de alíquota, o que nós propomos e o que o ministro está propondo é igual à CPMF, não tem outra alternativa. É um tributo sobre pagamentos. Pode chamar de João, ou de Maria, ou de imposto digital, é a mesma coisa.
Essa defesa da CPMF representa alguma compensação para o setor de serviços, que será onerado pela criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS)?
Não é só o setor de serviços que será onerado pela CBS. O do agronegócio também. Agora está começando a ver o tamanho do problema. Para os serviços, a tributação que hoje é de 4,5% vai saltar para 12%. É um aumento de 250%, sem nada para para compensar. Em um exemplo prático, se você paga R$ 100 para cortar o cabelo, o peso do PIS/Cofins é de R$ 3,65, se a empresa descontar por lucro presumido. Com a mudança proposta pelo governo, vai descontar R$ 12. Não tem como absorver essa alta sem repassar para o consumidor. E como vai repassar neste momento? Só é possível absorver a CBS com desoneração da folha. Se o substituto não for a CPMF, será a tributação de dividendos. Mas a melhor solução para substituir sem aumentar a carga é a CPMF, que amplia a base de contribuição, incluindo sonegadores e informais.