Se a reforma tributária era fundamental no Brasil pré-pandêmico, depois da covid-19 se tornou uma condição para que o país saia do fundo do poço. Há certo consenso de que batemos no fundo do efeito da crise em abril, mas também há confluência nos diagnósticos de que a saída será lenta e difícil. Por isso, tudo que puder dar velocidade à reação precisa trafegar com celeridade e desarmamento de espíritos.
A proposta do Executivo entregue ao Congresso nesta terça-feira (21) pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, não trouxe muitas surpresas. Foi pouco ambiciosa, como se previa, em tese em nome do respeito aos Estados. Como já tramitam dois projetos, um na Câmara e outro no Senado, a intenção é tentar costurar medidas de uma forma que contemple todas as visões.
A simples perspectiva de destravamento desse processo já deu um alento à economia, suavizando as projeções de queda para o PIB deste ano, ainda que discretamente. A sobrevivência dos negócios vai depender tanto de crédito quanto de alívio nos custos. Mesmo que a reforma não reduza a carga tributária, o que é uma impossibilidade fática quando a União e os Estados encaram despesas extraordinário no combate ao contágio tanto sanitário quanto econômico do coronavírus, se o resultado foi o mínimo esperado, a simplificação tributária, já será um alento.
Chamado de "manicômio" ou "cipoal", o sistema tributário brasileiro é tão disfuncional que será difícil piorá-lo, embora não seja impossível. Só para calcular e cumprir as obrigações tributárias, as empresas gastam 62,5 dias ou 1,5 mil horas, conforme o mais recente relatório Doing Business, do Banco Mundial, de outubro de 2019. Mesmo tendo reduzido 457 horas em relação ao ano anterior, ainda é um recorde mundial. E a segunda posição é da Bolívia, com 1.025 horas anuais.
A enfática defesa feita por Guedes de sua versão de CPMF, o imposto sobre transações eletrônicas, já adicionou polêmica ao debate que será destravado com a chegada, já atrasada, da proposta do Executivo. Guedes alega que seria a melhor forma de desonerar a folha de salários. Tão importante quanto aliviar o custo da contratação é reduzir o custo do pagamento de tributos. A versão Posto Ipiranga da CPFM não foi ao Congresso agora, porque o Ministério da Economia quer fazer a reforma em duas partes. Embora já esteja bastante madura no discurso de Guedes, a proposta precisa mesmo esperar, para permitir que mudanças consensuais avancem.
Como ensinam os manuais de Economia, quanto mais alto o custo de se manter em dia, maior a disposição de correr o risco de não fazê-lo. Se Guedes precisa arrecadar, tem o dever de fazer com que seja uma tarefa possível cumprir as obrigações com o Fisco. Disso depende não só a sobrevivência e a viabilidade de boa parte das empresas afetadas pela crise como o investimento estrangeiro do qual o país tanto depende para a recuperação no pós-pandemia.