A conta extra da transformação do Bolsa Família em Auxílio Brasil ainda não pode ser feita com precisão, porque a apresentação do novo programa não inclui o valor, mas já é estimado em pelo menos R$ 15 bilhões, embora também se fale em R$ 25 bilhões.
Caso seja confirmado, vai levar para R$ 53,7 bilhões o custo fiscal das medidas com foco na reeleição de Jair Bolsonaro. Se atender aos políticos, pode chegar a R$ 63,7 bilhões. O mercado recebeu a entrega do projeto com desconfiança: o dólar chegou a R$ 5,29 e a bolsa recuou, embora no início da tarde ensaie reação.
Economistas, analistas de mercado e investidores se inquietam com a intenção de prorrogar o pagamento de precatórios para financiar o reforço no pagamento do benefício social, conforme informado pelo ministro da Cidadania, João Roma, de "pelos menos mais 50%", ou seja, de cerca de R$ 190 para em torno de R$ 300.
— Ainda que a vinculação entre ambos não exista de fato, os precatórios estão sendo usados como contrapartida da elevação de gastos do Bolsa Família. A estratégia de Bolsonaro de elevar o valor do Bolsa Família tem como externalidade a eleição de 2022, e a sensibilidade da popularidade dele a injeções de capital já sofreu teste com o auxílio emergencial. Trata-se de algo extremamente ruim, com contorno constitucional ao teto de gastos, ou seja, um retrocesso no arcabouço fiscal — avalia Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Além do reforço no benefício social, o cálculo das medidas com foco em reeleição inclui a isenção de imposto para o diesel em 2022 (R$ 26 bilhões), a redução de arrecadação de R$ 7,7 bilhões para Estados e municípios representada pela reforma tributária e a estimativa de R$ 5 bilhões em aumento para o funcionalismo federal, se der certo o plano da equipe econômica de limitar o reajuste.
Na semana passada, o mercado já antevia o risco de uma nova pedalada, especialmente depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou, sobre os precatórios:
— Devo, não nego; pagarei assim que puder. Calote não há; se perguntar aos pequenos, eles vão dizer que não. Os maiores vão ter alternativa.
A amarração entre a pedalada nos precatórios e o reforço no Auxílio Brasil é indireta. Guedes quer tirar o pagamento dos precatórios, que considera insustentável, do cálculo do teto de gastos. Para bancar os valores menores, seria criado um fundo formado por recursos de venda de subsidiárias ou estatais. Os maiores, como Guedes já indicou, seriam parcelados — a "alternativa" de que fala o ministro.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi cauteloso ao comentar a ligação entre Auxílio Brasil e os precatórios:
— Uma PEC que visa a um ordenamento de uma questão que nos preocupa muito, essa questão dos precatórios, para que não tenhamos nenhum tipo de narrativa a prejudicar a imagem do Brasil e do ordenamento das contas públicas.
Pode ser só discurso. Pode ser mais um "sinal amarelo".