Não foi apenas a pesada alta no juro básico decidida na quarta-feira (17) pelo Banco Central (BC) que surpreendeu a maioria dos brasileiros. Ao informar a medida, o Comitê de Política Monetária (Copom) fez questão de avisar que, sem grandes mudanças, vai administrar nova dose de mesmo tamanho em 5 de maio.
Isso significa que, em 50 dias, a Selic saltará de 2% para 3,5%, um senhor choque de juro. Se tudo der certo, trará o efeito desejado — frear dólar e inflação — mas também os colaterais, como desaceleração na atividade e aumento da dívida pública.
O trecho do comunicado do Copom que avisa sobre mais uma superdose de juro está lá no penúltimo parágrafo mas é bastante claro: "para a próxima reunião, a menos de uma (sic) mudança significativa nas projeções de inflação ou no balanço de riscos, o Comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude" (destaque da coluna).
A coluna já abordou os motivos que levaram o Brasil a essa situação contraditória — elevar o juro, medida que normalmente faz a atividade econômica desacelerar, em meio a temores de nova recessão técnica. Agora, é preciso debulhar as consequências: a primeira e mais óbvia é que a taxa quase duplicada em 50 dias vai diminuir a velocidade da recuperação econômica que já era baixa.
Nesse caso, o maior problema é que o crédito ficará mais caro exatamente quando o agravamento da pandemia no Brasil, provocado por erros no controle do contágio, determina novas restrições e exige socorro na forma de financiamento para pequenas e microempresas.
Nesse caso, o que pode ajudar a modular a freada é o comportamento do câmbio. Como se esperava, nesta manhã de quinta-feira (18), o dólar abriu em baixa, embora discreta, de 0,31%, para R$ 5,564. Se houver declínio constante, a inflação no atacado cede e retira um dos muitos fatores de desequilíbrio na produção, os aumentos de matérias-primas que chegam a passar de 12o%, como relatam empresários.
Outro efeito colateral, esse sem amortecedor à vista, é o aumento da dívida pública. Para lembrar, os credores do Brasil não são apenas grandes fundos ou bancos, mas cada cidadão com aplicação em renda fixa, no Tesouro Direto ou outras opções baseadas em títulos públicos.
Conforme levantamento de André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton, 30% do total devido é indexado pela Selic. Com base nas contas de Perfeito, a elevação com Selic a 2,75% resultaria em acréscimo de R$ 50 bilhões. Com a nova dose de maio, serão mais R$ 100 bilhões de endividamento, mais do que o dobro do limite de gasto extrateto com o auxílio emergencial, de R$ 44 bilhões. Para quem estranha o tamanho das cifras, é bom lembrar o volume total da dívida brasileira: R$ 5 trilhões no final de 2020, conforme informado pela Secretaria do Tesouro Nacional.