O jornalista Leonardo Vieceli colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
As queimadas na Amazônia e no Pantanal preocupam empresários. Diante dos prejuízos à imagem brasileira, 38 líderes de grandes companhias e entidades solicitaram ao governo federal, em julho, melhorias na área ambiental, incluindo o combate ao desmatamento. De lá para cá, o movimento cresceu e hoje reúne 80 integrantes. Uma das entidades à frente da mobilização é o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Em entrevista à coluna, a presidente do CEBDS, Marina Grossi, avaliou o tema. Leia os principais trechos.
Como surgiu o movimento e quais foram os principais avanços desde então?
Do ponto de vista financeiro, temos ouvido muito a palavrinha ESG (sigla em inglês para melhores práticas ambientais, sociais e de governança). No Brasil, houve um primeiro movimento de investidores em junho. Na ocasião, um grupo de 29 instituições gerenciando mais de US$ 3,7 trilhões em ativos exigiu que o governo freasse o desmatamento. Depois, em julho, houve a assinatura dos 38 CEOs, hoje 80.
É preciso combater o desmatamento ilegal. Isso tem enorme impacto não só na reputação do Brasil, mas nos negócios. A empresa que está fazendo a coisa certa na Amazônia não está separada do restante do país. A mensagem muito clara é de que a gente precisa de metas para zerar o desmatamento ilegal. O crime beneficia poucas pessoas, você consegue combatê-lo.
Há grandes empresas que preservam e produzem, respeitam a comunidade local. Mas o garimpo ilegal, que é predatório e causa doenças, está competindo com a mineração, que faz a coisa certa, por exemplo. Ele está afugentando o capital que faz a coisa certa, que quer ganhar recursos em ESG. É preciso atrair esse capital. O Brasil tem condições de atrai-lo.
Isso é mais importante ainda quando pensamos em sair da pandemia e da recessão. O que precisamos privilegiar para ter uma economia mais resiliente? É preciso privilegiar esse modelo de negócios, em que o Brasil é competitivo, e não outro. São mensagens importantes, inclusive para uma retomada verde.
Em qual nível o Brasil está quando se fala em iniciativas voltadas a uma economia mais verde?
Isso já é feito. Mas é preciso fazer muito mais. O desafio é que o território é muito grande. Então, é preciso juntar forças. Não à toa, os três bancos que assinaram nosso comunicado (Bradesco, Itaú e Santander), que depois virou um movimento, com 80 assinaturas, juntaram-se nessa iniciativa. É uma ação que exige muito esforço, colaboração.
O setor privado pode fazer mais, quer fazer mais, sabe que tem de fazer mais, mas tem uma parte em que precisa do governo. Por exemplo, na hora de combater o crime. O setor privado já faz a rastreabilidade. Quem quer comprar uma carne que não veio de uma área desmatada vai olhar essa parte da rastreabilidade dos produtos, que já existe nas nossas empresas.
Como avalia a postura do governo em relação ao desmatamento ilegal?
Fomos bem recebidos pelo vice-presidente Hamilton Mourão, na qualidade de presidente do Conselho da Amazônia. Em julho, ele prometeu que faria um estudo e apresentaria metas, entende ser um papel do Estado. A gente também conversou com o consórcio de governadores da Amazônia Legal. Alguns Estados já têm metas, outros falaram que avançariam nessa questão. Mas acho que falta integração maior entre o governo federal e os estaduais para as coisas acontecerem. A gente viu uma falta de integração bastante grande.
Conversamos com o Judiciário, no STJ (Superior Tribunal de Justiça), e vimos que o Judiciário tem dificuldades, porque muitas vezes esses crimes sequer têm um inquérito. Percebemos que existiam lacunas para serem preenchidas. Estamos buscando pressionar para que isso seja resolvido, integrando esforços. Na Câmara, conversamos com o presidente Rodrigo Maia. Estamos sendo bem recebidos pelas instituições, mas é preciso que as respostas sejam mais rápidas. Estamos vendo o que está acontecendo, o Brasil tem de deixar muito claro que faz o dever de casa, que é um lugar com segurança jurídica e que, portanto, pode atrair investimento.
Queimadas no Pantanal ganharam repercussão nas últimas semanas. Qual é a avaliação sobre esse episódio?
O que posso dizer é que, se você não tem uma clara sinalização, com medidas pragmáticas, como metas de redução do desmatamento por parte do governo, você não vai conseguir atrair investimento. Independentemente do bioma, Amazônia ou Pantanal, dizer que reconhecemos problemas e que estamos tomamos ações permite avanços. São sinais que precisam ser dados.
O ponto inicial para melhora na área, então, é traçar metas de combate ao desmatamento?
É o fundo fundamental. Não adianta fazer marketing. Nenhuma propaganda se sustenta sem ação real e concreta. O setor privado sabe muito bem disso. É preciso que, de parte do governo, esteja clara qual é a meta, como vamos acabar com o desmatamento ilegal. Esse sinal precisa ser claro. É a virada de página.
Fora do país, quais são os exemplos em economia verde?
Está claro no setor privado que a pandemia, com muito sofrimento para todo o Brasil, acelerou tendências. A tendência de investimentos baseados em ESG foi acelerada. A tendência de ir para uma economia de baixo carbono foi acelerada. Nesse sentido, o que a Europa, a China, a Coreia do Sul e outros fizeram foi empacotar medidas ambientais que já estavam sendo conversadas como medidas políticas e econômicas para recuperar os países.
Dão um sinal claro de que você vai ter, nos produtos, um padrão baseado em uma economia mais limpa. São padrões em que temos vantagem comparativa e podemos ofertar produtos. Então, achamos que é urgente mostrar as mesmas bases para sermos um ator importante na nova economia. Já somos naturalmente, pela diversidade, pela matriz limpa. Mas a gente tem de deixar de causar ruídos. As empresas têm várias ações para atrair esse capital.
A inflação já foi um problema para o país. O desmatamento ilegal está sendo um problema no país. Temos de virar essa página para que a gente possa usufruir das coisas que o Brasil tem.