Mesmo antes de a revista Veja publicar a informação de que a Contribuição sobre Pagamentos (CP), versão da CPMF do governo Bolsonaro, começaria a ser cobrada com alíquota de 0,19% para alcançar até 0,67% ao fim de dois anos, o tributo sofria forte oposição, inclusive entre empresários, que supostamente seriam beneficiados pela sua criação. Quem lembra da cobrança que vigorou até 2005 não esquece dos percentuais que vigoraram: começou com 0,2%, terminou com 0,38%. Não houve, até o final da tarde de domingo, desmentido do Ministério da Economia.
Se a CP, que o secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, insiste em dizer que não é CPMF (veja tuíte abaixo), já assustava com alíquota de 0,19%, agora corre o risco de virar o trem fantasma da Esplanada dos Ministérios. Era com base na alíquota inicial que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmava que a volta da cobrança não passaria "de jeito nenhum". O fato de ser "pequenininha" era usado como argumento pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para sustentar que o novo tributo "não machuca". Se houver chegar a quase o dobro, pode-se presumir, os ferimentos serão graves.
A alta rejeição da CP, versão da CPMF resumida na sigla e ampliada na alíquota, concentra-se em quatro argumentos:
1. É socialmente injusta: ao contrário do Imposto de Renda, que isenta de cobrança quem ganha até R$ 1.904 e estabelece a "escadinha" – alíquotas menores incidem sobre parcelas crescentes até o limite estabelecido até para quem ganha mais –, a CP vai cobrar de 0,19% a 0,67% de todos os brasileiros, sejam empregados que recebem salário mínimo ou detentores de imensas fortunas. Essa característica corresponde ao que os especialistas chamam de "regressividade", ou seja, quem ganha menos paga mais, proporcionalmente. O presidente Jair Bolsonaro, que já foi radicalmente contra, mas agora relativizou sua posição, condiciona seu "ok" à isenção para quem ganha até R$ 5 mil.
2. É cumulativa: essa característica afeta mais empresas do que pessoas físicas, mas adivinha onde é que a conta vai parar? Haverá cobrança do pagamento feito na venda do trigo ao moinho, na venda da farinha à padaria, e na venda do pão ao consumidor final. Isso sem contar todos os demais insumos, da água à eletricidade. Conforme empresários, a pior parte é o fato de que, quanto maior a cadeia produtiva, mais empregos são gerados. E as cadeias mais longas seriam justamente as mais afetadas, com perda de competitividade em decorrência da incidência sucessiva da CP.
3. Não é compensável: atualmente, o disfuncional sistema tributário brasileiro permite que, ao pagar tributos na ponta final, os produtores possam descontar os que já pagaram na compra de matérias-primas e outros insumos. Com a CP, não haveria mais essa possibilidade.
4. Vai estimular o uso de dinheiro vivo, como forma de driblar o pagamento, aumentando, ao invés de reduzir, o tamanho da informalidade na economia, uma das intenções do governo.
Entre as vantagens com as quais o governo acena, uma é a redução da informalidade,
já relativizada pela grande maioria dos especialistas. É excesso de otimismo imaginar que quem faz esforço para se manter à margem da regularidade fiscal não desenvolva alguma alternativa à CP. Outra é a desoneração da folha de pagamento, que os empresários querem muito, mas não com essa ferramenta, e a terceira é facílima de entender: é um tributo muito simples de arrecadar. A proposta, que no governo ganhou o rosto de Marcos Cintra, foi levantada ainda durante a campanha por Paulo Guedes.