A promessa de envio de um novo projeto de lei complementar ao Congresso para garantir a autonomia formal do Banco Central é, ao lado do "revogaço", um dos mais promissores anúncios do presidente Jair Bolsonaro para marcar seus primeiros cem dias de governo. O debate em torno do tema tem décadas, e o comportamento dos mais recentes presidentes da instituição acentua a maturidade para adotar esse novo passo. Desde Armínio Fraga, que ficou de 1999 a 2003, quase todos tomaram decisões sem prestar contas ao presidente da República. Houve uma exceção, a do gaúcho Alexandre Tombini, que ocupou a cadeira entre 2011 e 2016, que aceitou um dos conceitos da "nova matriz econômica" e baixou o juro básico mesmo com inflação elevada para cumprir uma política de governo.
É essa, justamente, a intenção da concessão de autonomia formal: evitar que o BC seja usado para executar políticas de governo e possa desempenhar sua função – preservar o valor da moeda do país – com isenção. Nos países onde essa regra funciona de verdade, uma das formas de fazê-la funcionar é alternar tempos de mandato entre a Presidência da República e a do BC. É assim, por exemplo, nos Estados Unidos. Quando Donald Trump assumiu, encontrou à frente do Federal Reserve, nome do BC americano, Janet Yellen, que havia sido indicada por Barack Obama. Em vez de reconduzi-la ao cargo, como havia feito o próprio Obama com Ben Bernanke, nomeado por seu sucessor, George W. Bush, Trump acabou a substituindo, ao final do primeiro período de mandato, pelo atual presidente, Jerome Powell.
Na segunda-feira (8), em Porto Alegre, o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto fez uma defesa enfática da autonomia do BC. Lembrou que a instituição foi pensada por seu avô, Roberto Campos, para ter independência formal a partir de 1964 – ano do golpe militar que instituiu a ditadura no Brasil –, mas só durou quatro semanas. Houve risos na plateia. Sustentou que a discussão sobre o tema está madura e afirmou que o projeto está avançando. No entanto, a proposta enviada no início do ano segue parada na Câmara dos Deputados.
Formalizar a autonomia do BC também é uma forma de o Brasil melhorar sua imagem internacional. Ter uma instituição com selo de independência cuidando da moeda é considerada uma boa prática de gestão pública internacional. Está em linha com a ambição do Brasil de aderir à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), exatamente para esse fim. Na avaliação da atual equipe econômica, é uma forma de compensar o fato de o país estar distante do chamado grau de investimento (boa nota de avaliação de risco de crédito) e também uma maneira de acelerar a recuperação desse selo de bom pagador.