Se fosse um filme, a história de Mikael Medeiros, 19 anos, nomeado em outubro de 2017 para coordenar a área de recursos logísticos do Ministério do Trabalho pelo então responsável pela pasta, Ronaldo Nogueira (PTB) e depois promovido a gestor financeiro, seria considerada inverossímil mesmo antes da mais recente sequência de fatos.
A palavra tão sintética que quer dizer "falta de semelhança com a verdade" parece insuficiente para descrever o que os brasileiros ficaram sabendo nos desdobramentos do espanto causado pelo fato de um profissional tão júnior administrar contratos de quase meio bilhão de reais. Para facilitar o acompanhamento, os fatos narrados pelo Jornal Nacional, sem ficção:
1. Mikael é filho de Cristiomário Medeiros, presidente do PTB de Planaltina (GO), aliado do líder na Câmara, Jovair Arantes, que indicou para o cargo.
2. No dia seguinte à promoção, Mikael autorizou pagar
R$ 27 milhões à Business to Technology (B2T), depois que servidores de carreira do ministério foram afastados por se negarem a fazê-lo.
3. A B2T havia sido contratada por Leonardo Arantes, sobrinho de Jovair, para detectar fraudes no seguro-desemprego.
4. Em 2016, quando o PTB assumiu o Ministério do Trabalho, o faturamento da B2T saltou, fruto de contratos de R$ 40 milhões.
5. Jovair confirmou a indicação, mas disse ser responsabilidade do ministério aceitar ou não.
Essa história se passa em um país que mal consegue emergir de dois anos de recessão profunda, criou teto para as despesas públicas e tentava aprovar reforma da Previdência até seu presidente ser atingido por duas denúncias criminais. Ao focar esforços para barrar as acusações, deixou de lado essa preocupação. Esse país corta verbas para universidades e hospitais públicos por conta de crise nas finanças públicas que já determinou até a suspensão na emissão de passaportes.
Como casos como o de Mikael não são isolados no Planalto – neste e em outros governos –, ajudam a explicar a resistência dos brasileiros em compreender e aceitar os dados que mostram a necessidade de cortes de despesas. É óbvio que, antes de aceitar sacrifícios tanto a áreas fundamentais, como saúde e educação, ou que representem perdas reais e imediatas, os contribuintes cobrem que as torneiras certas sejam fechadas antes.