Uma das tarefas de um novo governo no Brasil, como ouvimos nas várias gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, é fazer reformas tão indispensáveis quanto impopulares. São mudanças que alteram, se não os “direitos adquiridos”, ao menos a “expectativa de direitos”, como caracterizou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ao mencionar a Previdência. Como está claro há anos para os especialistas, o sistema precisa de mudanças. Assim como são inadiáveis as reformas política, tributária e trabalhista – para não ter ambição excessiva.
Toda expectativa depositada no governo de Michel Temer era de que seria “itamarizado”, quer dizer, o presidente interino se tornaria um facilitador da condução de consensos reforçados por erros cometidos nos últimos anos. Para isso, precisava de um ministério de “notáveis”, pessoas reconhecidas por conhecimento técnico e capacidade de gestão. A área econômica, a mais dramática, foi a que melhor entregou a encomenda. Com o próprio Meirelles, a indicação de Ilan Goldfajn para o Banco Central, de Pedro Parente para a Petrobras, de Mansueto Almeida para um cargo-chave na Fazenda. Faltou sintonia na Caixa Econômica Federal, com presidência definida por indicação política, e no Banco do Brasil, que poderia ter nome de maior estatura.
Mas o Ministério do Planejamento, sabe-se desde a escola, integra a equipe econômica. E foi lá que Temer cometeu seu maior equívoco, ao confirmar Romero Jucá no cargo. Como Dilma Rousseff ao nomear Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil, aumentou os respingos da Operação Lava-Jato dentro do Planalto. Vieram as gravações e, mais cedo do que se poderia supor, o governo perdeu seu principal articulador político. Jucá segue atuando a favor de Temer no Senado, mas com a imagem lanhada e interlocutores acautelados.
O sucesso no primeiro grande teste parlamentar de Temer, a aprovação da meta fiscal de déficit de R$ 170,5 bilhões, empalideceu frente aos aúdios. Nesta semana, terá de avançar a discussão da reforma da Previdência. Mesmo que a adoção imediata da idade mínima de 65 anos seja um bode na sala, as mudanças não vão favorecer candidatos a beneficiários do sistema.
Para que seja aceito ao menos o debate sobre as alterações, é preciso ter segurança de que não há alternativa a não ser abrir mão da tal “expectativa de direito”. Assim como o discurso contra a recriação da CPMF passava por não dar mais dinheiro público a um governo que não cuidava de seus cofres, pedir sacrifícios da população sem exibir mãos limpas é tão difícil quanto garantir base de sustentação em um Congresso contaminado pela fome de benesses.