No dia em que foi anunciado o déficit recorde da Previdência, de R$ 268,7 bilhões, somados os sistemas privado e público, ministros do governo Temer acabaram protagonizando um episódio contraproducente para uma equipe que deveria trabalhar afinada pela reforma.
Apresentados os números, é bom fazer algumas contas. O buraco no regime geral corresponde a mais de dois terços do total. Mas o déficit per capita dos servidores chega a R$ 86,4 mil, enquanto o dos benefícios do INSS são de R$ 5,5 mil – quase 16 vezes maior.
A menos de um mês da data marcada para votação da reforma que unifica os sistemas, a divulgação do resultado mudou para tentar reforçar os argumentos favoráveis à proposta. Até então, os déficits eram calculados separadamente, e apenas o do regime geral era divulgado com pompa e circunstância.
Com a resistência entre os servidores federais se adensando – os analistas-tributários da Receita Federal entram nesta terça-feira (23) em operação padrão por reajuste salarial e contra a reforma –, seria óbvio esperar uma posição coesa na Esplanada dos Ministérios.
Quando o ministro das Cidades, Alexandre Baldy, cujo nome muitos brasileiros sequer aprenderam, resolve dizer que as declarações do colega da Fazenda, o decano Henrique Meirelles, “atrapalham”, expõe a falta de sintonia até nos círculos mais fechados do Planalto. Pode ter sido provocado, é claro, mas saídas diplomáticas a perguntas espinhosas fazem parte das obrigações do cargo.
O que Meirelles disse está no radar de qualquer analista. A chance de aprovar ao menos idade mínima para aposentadoria e um sistema único em fevereiro é de 50%, e se não passar dentro de um mês, há chance de fazê-lo em novembro. Mas é, de fato, contraproducente para um governo cuja existência é justificada pelo reformismo.
Esvazia, inclusive, o discurso de Marcelo Caetano, secretário da Previdência de seu próprio ministério, que sacudiu o espantalho da Grécia para acentuar os riscos de não reformar o sistema previdenciário. Ao detalhar os dados, Caetano afirmou que o Brasil ainda tem tempo antes de ter de adotar medidas drásticas como cortes nos benefícios já concedidos.