Domingo, 26 de janeiro, um acidente de carro trivial na zona sul da Capital, resultou num triplo homicídio. Um veículo com uma família colidiu de leve com um carro estacionado, porém não parou. Os donos do veículo batido, uma mãe e um filho, saíram no encalço. Quilômetros depois, alcançaram, cortaram a frente do outro carro e começaram uma discussão.
As versões são conflitantes, mas o que é dado como certo, é que o rapaz atira no trio oponente: um casal e o filho mais velho. Os tiros são todos na cabeça. De dentro do carro, o filho mais moço e a namorada do mais velho, assistem ao filme de terror da morte de seus queridos.
Para escárnio do bom senso, o atirador ao ser preso alegou legítima defesa. Esta semana a mãe do rapaz diz que o filho dela não é um monstro. Sinto dizer a essa senhora que ela está errada. Ele não era, agora é. Um assassinato por motivo fútil cria um monstro. Com este ato, este rapaz cruzou a fronteira do que nos faz civilizados.
Ele se converteu em um assassino ao acreditar que um dia poderia usar uma arma, a arma da família, em vez de usar a cabeça e a cordialidade da dúvida. Pode até pagar sua dívida com a justiça, mas não com a humanidade. Tornou-se mais um monstro em uma sociedade que já tem tantos.
Onde essa senhora erra, e muitos certamente a acompanham nesse raciocínio, é em acreditar que a monstruosidade é uma inclinação de caráter, uma maldade essencial. Até existem monstros assim, mas a grande maioria são apenas seres comuns, esvaziados de sentido, de educação e de reflexão. Pobres diabos que abrem covas, para si e para os outros, com a sua indigência de espírito.
O drama desse rapaz foi navegar acriticamente pelo espírito do nosso tempo. Época de litigância e da convicção deque se pode resolver disputas com armas. Época que, diante da violência, dobra a aposta com mais violência. Ele incorporou discurso bélico.
Em seus momentos de lazer, brincava de soldado com airsoft. Trata-se de uma modalidade esportiva que simula combates com armas de ar comprimido. Por essa prática, os tiros foram tão certeiros. Especulando, talvez para ele não fosse apenas um esporte, mas parte de uma filosofia, uma maneira de encarar a existência: pensando a vida como guerra. Se fosse um verdadeiro soldado, saberia sobre a parcimônia da violência.
Se o desfecho foi rápido, a preparação ao ato foi longa. Não começa com a batida de carro, começa com derrota das palavras e a tendência a resolver situações de impasse pela violência e pelo medo.
Nada do que ele, ou a sociedade vier a fazer, reparará o dano produzido. Ele matou uma família em segundos. Por rebote, também assassinou a paz da sua família e, provavelmente, de sua vida. Foi uma chacina com mais do que três mortos no chão.