Toda crise repentina – um terremoto, por exemplo – tem quatro fases distintas. Quando o problema eclode, não se tem ideia clara da dimensão do desastre. Depois, a crise vai escalando uma curva até alcançar o auge. Neste momento, surgem sentimentos de exasperação, desamparo ou revolta. Em seguida, começa o declínio, caracterizado pelo controle da crise e pela administração das consequências imediatas. Por fim, há um longo epílogo, que pode ter dois caminhos: a prevenção dos efeitos de nova tragédia ou o esquecimento.
Quase duas semanas após o grande temporal de 16 de janeiro, quando 1,3 milhão de pontos se viram sem energia no Estado, estamos naquela encruzilhada. Pela nossa cultura do improviso, tende-se a acreditar que cortes de energia, com toda a sua funesta cadeia de prejuízos, fazem parte de nossas rotinas ou que medidas paliativas são a solução do problema.
Não são. Podar galhos ajuda, e, por segurança dos cidadãos, deve ser feito mesmo sem fios suspensos, mas uma nova tempestade como a de 16 de janeiro provavelmente terá repercussão similar. Investir em geradores é uma saída para poucos, além de terceirização de responsabilidades. Para que as próximas gerações não sejam atormentadas a cada tempestade, é preciso enterrar a fiação, começando pelos novos empreendimentos e pelas áreas de maior densidade comercial e de moradias.
Em Porto Alegre, há uma lei em vigor desde o ano passado. Até 2038, o emaranhado de fios que enfeia a cidade e desaba a cada ventania deve ir para baixo da terra. Os contrários sustentam que o custo é alto e que a conta será pendurada no consumidor. Mas se fôssemos aplicar para toda a infraestrutura o argumento do custo, ainda viajaríamos para o Litoral em estradas de chão, buscaríamos água de balde na fonte mais próxima e não teríamos substituído o lampião pela luz elétrica.
Além disso, em bom executivês, este é um caso clássico em que o Capex (o investimento) é amortecido a longo prazo pela redução do Opex (as despesas de operação). Nesta equação, as distribuidoras devem levar em consideração as perdas com a venda de energia a cada corte, os custos de manter enormes equipes de manutenção e lidar com a constante substituição de fios, postes e transformadores, furtos, multas, acidentes, indenizações e custas judiciais. E ainda há o intangível: a dramática crise de reputação que as atinge e que afeta o apetite de investidores e o valor das ações. A Light, a concessionária do Rio que está virtualmente quebrada, que o diga. Já para a sociedade, enterrar a fiação significará bilhões a menos em prejuízos com a economia parada, vidas em suspense e oportunidades perdidas.
É hora, portanto, de se tomar o caminho daquela encruzilhada que leva a uma solução definitiva para todos.