Esse negócio de qual é a maior invenção da história depende muito das circunstâncias. Na cadeira do dentista, ao ouvir o som da broca, você pode achar que é a anestesia. E, de madrugada, ao atender o bebê molhado, você acenderá uma vela ao inventor da fralda descartável. Mas, abstraindo-se situações peculiares e pulando aquela história de fogo e roda, eu diria que é a energia, a bendita luz elétrica.
Foi ela que libertou as forças produtivas em larga escala e permitiu o adensamento urbano. Sem o elevador, outra grande invenção, não haveria prédios altos, e os custos de todos os serviços básicos se multiplicariam. Foi a eletricidade que desencadeou revoluções em série, da lâmpada elétrica à internet, passando pelas comunicações e as telecomunicações, e, hoje, até pelo trabalho remoto. Desaprendemos a viver sem energia. Sem ela, estamos inertes, como podemos atestar mais uma vez esta semana no Rio Grande do Sul, quando boa parte do Estado foi despachada de volta ao período megalítico.
As causas das constantes faltas de luz são evidentes. Há uma ventania, os postes sobrecarregados por fios vergam ou a fiação descontrolada é derrubada por galhos. Ou seja, se nada diferente for feito, enquanto houver vento e árvore haverá falta de energia. Então, a solução mais óbvia para se evitar a pré-história é enterrar a fiação, como o fazem todas as nações civilizadas, onde, à exceção de zonas afastadas, desconhecem-se cortes de energia durante tempestades.
Como as intempéries não tendem a amainar, aqui vai uma recomendação aos conselhos de administração das empresas de distribuição. Considerem inevitável o investimento para enterrar a fiação. E podem levar junto para as profundezas aquele medonho amontoado de fios e traquitanas de terceiros que as distribuidoras permitem pendurar nos postes para arrecadar aluguel. As cidades brasileiras e a sociedade não vão suportar mais algumas décadas de cortes constantes de energia. Então, é melhor as distribuidoras começarem a agir, antes que ajam por elas.
A fiação suspensa é apenas a face mais visível e horrenda de um modelo que está nitidamente esgotado. Para resolver de vez a questão da baixa qualidade do serviço, é preciso recorrer a um santo remédio do capitalismo: a livre concorrência. Foi a estatização da energia que nos trouxe até essa situação esdrúxula de hoje. E são os monopólios privados que preservam um status quo que mescla letargia com desestímulo a mais investimentos. Então que se aplique finalmente à distribuição de energia o modelo das telecomunicações: quem oferecer o melhor serviço, com o custo mais baixo, fica com o cliente. Fiat lux, sempre com a fiação enterrada, bem entendido.