A cena nos pavilhões do Riocentro para quem estava lá como eu, parte da equipe de repórteres enviada por ZH, era de um otimismo radiante. Lado a lado, 92 chefes de Estado, de Fidel Castro a George Bush, posavam para uma foto que selava o compromisso com o futuro do planeta. Há exatos 30 anos, entre 3 e 14 de junho de 1992, o Brasil se transformava no epicentro da defesa ambiental ao receber a Rio-92, tida como a principal conferência da ONU desde a sua criação e que desbravaria a trilha para acordos como o de Paris e o Protocolo de Kyoto.
Diga-se o que se quiser sobre o então presidente Fernando Collor de Mello, mas um mérito não se pode tirar dele. Bom de marketing, Collor tinha a dimensão do enorme dano à imagem do Brasil causado pelas queimadas na Amazônia, pelas invasões de terras indígenas e pelo garimpo descontrolado. Ao assumir, jogou uma cartada de impacto: convidou o mais consagrado ambientalista brasileiro para chefiar a Secretaria de Meio Ambiente. Não sem irritar a esquerda, o gaúcho José Lutzenberger aceitou o posto e deixou claro que ambiente não tinha ideologia. Trabalhou para atrair a Rio-92, convenceu Collor a demarcar a reserva dos ianomâmis e enfrentou lobbies poderosos. Por algum momento, o principal produto de exportação do Brasil parecia ser a preservação de sua natureza exuberante.
Já no início daquele ano de 1992, ficara evidente para mim que, em se tratando de Brasil, o resto do mundo se preocupa de fato é com a Amazônia. Ao percorrer a linha de frente na Croácia, em guerra com a Sérvia, fui abordado para uma entrevista por uma TV local. Imaginei que iam tentar extrair uma declaração de apoio aos combatentes croatas quando veio a pergunta:
– Por que o Brasil está queimando a Floresta Amazônica? – quis saber o repórter, expressando a angústia global por outra longínqua e inexplicável frente de batalha.
Fiquei desconcertado, mas com a ficha bem caída. Se não quiser virar pária mundial, com prejuízos incomensuráveis para seus produtos – mesmo os que não guardam relação com as florestas –, o Brasil civilizado precisa vencer esse conflito interno, como bem demonstra a repercussão mundial pelo desaparecimento do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira. Collor tinha o pulso desta sensibilidade há 30 anos e, além de abrigar a Rio-92, produziu imagens que correram o mundo ao mandar bombardear pistas de garimpo ilegal na Amazônia.
Em 2003, Lula seguiu na mesma linha e trouxe para seu primeiro governo uma ambientalista de renome internacional, Marina Silva. Mais tarde, foram passando por cima dela, como havia ocorrido também com Lutzenberger, e chegamos aonde chegamos hoje: um Brasil arcaico e anacrônico que equivocadamente outorgou para o arsenal da esquerda a defesa do ambiente.