Minha coluna do sábado passado chamava-se “São só palavras”.
Esta, hoje, diz o contrário, e explico. Pois na anterior coloquei em prosa poemas meus, um pouco provocativamente, brincando com leitores que ainda dizem não gostar de poesia, mas em geral acabam elogiando essa pequena armadilha que lhes preparo.
Já fiz isso outras vezes, e gostei do resultado: não gostar de poesia pode ser, mais do que ignorância, preconceito.
Um querido amigo me disse que é preciso esperança por piores que sejam os tempos, ou até nos tempos piores. Sim. Mas confesso que em certos dias, há 10 meses confinada em casa – o que não me desgosta de todo, só sinto falta dos abraços, da família, das presenças –, tudo me vai cansando, sem grande luz no fim do túnel. Nessas conversas palavrosas e conflitantes sobre vacina, lá longe, quem sabe, a luzinha de um vagalume qualquer. Estou pouco otimista. Mas esperançosa, sim, do contrário, não seria suportável viver.
Cada dia mais doença e morte, cada dia mais pessoas saindo, trabalhando, se divertindo, porque ninguém é de ferro – por isso mesmo a Peste se espalhando e rindo com seus dentes de caveira.
Não tenho nada mais agradável para escrever hoje, no meio de tanta desolação, irritação, debates ou briguinhas que seriam adolescentes se não magoassem tanto. Pouca coisa a dizer, tipo, cuide do que é seu. Cuide de quem você ama, ame mais e melhor, e diga isso às vezes.
Procure ajudar a quem precisa, se não puder ser concretamente pela presença, que seja com palavras, telefonemas, uma flor, um bombom, uma escuta: escutar pode ser mais curativo do que falar.
Sobretudo, não brinque com a Peste, não diga que não é tão grave, que é exagero, que mais gente se cura do que morre (o que é verdade. Mas a quantidade dos sequelados, às vezes semanas depois de serem dados como curados, é enorme). E, mesmo que fosse uma pessoa só, não brinque, repito de novo, leve muito a sério.
Pânico? Não resolve e tira a lucidez. Cuidado, porque devemos, sim, ter medo. Medo que traz cautela, respeito a si e ao outro, medo de adoecer, sofrer, morrer quem sabe.
Também me ressinto dos meses confinada, porque, sinto muito, sou de alto risco. E meu confinamento não é dos piores, numa casa aconchegante, com belas paisagens diante da janela, companhia que amo, mas... a liberdade de abrir a casa para família e amizades, de tomar meu gim-tônica no British, de alguma pequena viagem, de perambular por alguma livraria... porque, sim, tenho medo. Que, digo de novo, traz cautela. Mas que cansa, ah, sim. A vida vai se cobrindo de uma sem-gracice, os livros parecem ter sido todos lidos e relidos,
o computador anda sem imaginação para produzir algo de original e bom, e não sou dada a tarefas domésticas.
Então, na internet, no telefone, e sempre nos livros (alguns ótimos programas de televisão), luto contra meu grande inimigo: o tédio. Que não tem nome, não tem rosto, não tem cheiro, não tem roupas nem voz, mas vai nos cobrindo com um doce, enjoativo, jeito de inércia e indiferença. O que também é um tipo de doença. Não são só palavras: Take Care.