Fiz as contas: faz praticamente seis anos que vivemos encarcerados no presente. Desde a campanha pela reeleição da Dilma, em meados de 2014, passando pela ameaça de impeachment (prometido por Aécio Neves no minuto posterior à proclamação dos resultados e levado a efeito por Eduardo Cunha, dois notórios), pelo processo em si (em que o atual presidente votou em honra de seu herói, Ustra, o único torturador brasileiro reconhecido pela Justiça como tal) em maio de 2016, o pesadelo Temer e seus muitos processos (que incluíram uma cadeia assim que ele perdeu a imunidade, em 2019), o processo do Mensalão e a condenação de Lula, até sua prisão, já em 2018, a eleição de Bolsonaro no fim deste ano e o governo dele.
Para dar um fim simbólico a essa lista, a demissão de Mandetta, semana passada, abril de 2020, em que o subordinado fritou o superior, no auge da crise mundial do coronavírus.
Que inferno. Qualquer uma dessas crises políticas e sociais seria suficiente para tirar o sono de uma geração. Uma só.
E é inferno para todos os lados, o que é muito mais impressionante. Vencedores e derrotados, em todos esses episódios, todos estamos bebendo fel desde então e até hoje, sem muito prazo para acabar. Como sair desse círculo vicioso, desse ciclo reiterado?
Não há piada, charge, análise ou meme que rompa essa prisão: tudo a reitera. Algum lado vai desistir antes? Vamos nessa queda de braço até quando e onde? Alguém tem alguma ideia diferente?
Eu não. Leio, escuto, vejo, converso, tento não perder o senso. Claro que tenho lado em todos os episódios listados no primeiro parágrafo, mas isso não é tão importante agora. Não quero também eu repetir aqui o que já sabem tanto os que concordam quanto os que discordam.
Exigir do presidente racionalidade e respeito à ciência já se viu que é inútil; sonhar com sua renúncia ou impedimento parece lunático. Acreditar no governador tem sido bem mais fácil, porque bem mais razoável. Mas quem manda no Brasil é Brasília, e este é mais um texto inútil, que nem esclarecer consegue. Desculpa aí.