No final de 1938, o jovem Lupicínio Rodrigues desfrutava da fama pelo sucesso da música Se Acaso Você Chegasse. A Revista do Globo entrevistou o sambista porto-alegrense para a última edição daquele ano. O compositor ainda era "pouco conhecido pessoalmente", mas o nome era "murmurado todas as noites nos microfones, nas rodas de cafés, nos quartos de estudantes e até mesmo nos meios sociais de Porto Alegre".
A família do músico morava na Ilhota, região frequentemente inundada antes da canalização do Arroio Dilúvio. Sem saber que faria ainda mais sucesso até morrer em 27 de agosto de 1974, a reportagem apontou que Lupi vivia "o apogeu da sua glória como sambista". Quando abordado para a entrevista, se mostrou surpreso.
— Será a primeira vez que se faz isso em Porto Alegre. Um sambista, no Rio, à primeira composição, já vê o seu nome enchendo as páginas das revistas, ecoando pela rua, e mais do que isso, passa logo a ganhar dinheiro. Mas aqui não acontece o mesmo. É preciso um autor fazer sucesso para que se acredite nas suas possibilidades — desabafou Lupi.
O compositor contou que, aos 13 anos, iniciou "nos bailezinhos da vizinhança". Gostava de samba, mas não aprendeu a tocar instrumentos. Cantava seus sambas, fazia as letras tiradas de "algum assunto íntimo" e pedia para alguém escrever a música.
Na Exposição Farroupilha, em 1935, cantou e venceu concurso com o samba Triste História. Questionado sobre sucessos posteriores, citou Pergunte aos Meus Tamancos, gravado por Alcides Gonçalves no Rio de Janeiro.
— Com esse samba fiquei bastante conhecido na capital federal, o que me valeu para mais tarde boa aceitação dos meus novos sambas — recordou.
Em setembro de 1938, o jornal carioca Gazeta de Notícias publicou que o "abafa do momento" era o samba-canção Se Acaso Você Chegasse, gravado por Cyro Monteiro. Na entrevista à Revista do Globo, Lupi disse que a letra foi inspirada em uma "notícia policial de jornal local".
— Escrevi este samba há um ano mais ou menos. Sady Nolasco cantou-o na Farroupilha e Leo Villar, um dos componentes do conjunto Anjos do Inferno, que estava aqui, levou-o para o Rio. Este é o samba que eu mais gosto dos meus — resumiu o gaúcho.
A entrevista terminou com outra música. Perguntado se esperava fazer sucesso com um dos sambas e marchas compostos para o carnaval de 1939, Lupi sorriu, fez sinal para amigo que estava abraçado em violão e tirou uma caixa de fósforos do bolso. Cantou Briga de Amor.
Era apenas o início da carreira espetacular de Lupicínio Rodrigues.