O julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu pela abertura de seis ações penais contra o senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) traz elementos importantes para observarmos em relação à discussão aberta sobre os limites que envolvem a liberdade de expressão e o uso das redes sociais — neste caso com o recorte ainda mais específico por se tratar de um parlamentar.
Na terça-feira (3), a Segunda Turma do STF entendeu que a imunidade parlamentar — uma espécie de regra que protege políticos para que possam falar e não serem censurados — não é algo absoluto, ou seja, tem limites. E eles foram apontados pelos magistrados da Suprema Corte.
Foram três votos a dois pela abertura das ações penais.
Há dois aspectos a serem destacados. O primeiro, que costuma aparecer quando a discussão se dá em torno do alcance do foro privilegiado, é sobre a necessidade de o evento em análise estar relacionado ao exercício do mandato. Ou seja, quando ultrapassa essa linha, a ação deixa de contar com a proteção da regra.
O voto do ministro Gilmar Mendes pontuou neste sentido. Conforme observou reportagem de O Globo, as declarações de Kajuru (em análise pela Segunda Turma) apresentaram caráter "injurioso e difamatório", não se inserindo no debate de ideias e não havendo nexo com o exercício do mandato de senador. Também votaram nesta linha os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski.
"Tem razão o ministro Gilmar Mendes quando afirma que a ofensa descontextualizada do debate e que descambe para a simples agressão ou violência verbal, além de poder ser considerada como passível de sanção cível ou criminal, também não está amparada pela imunidade. Mais ainda: a utilização de meios ardilosos e fraudulentos, com a propagação de notícias falsas para veicular as ofensas constitui nítido abuso da prerrogativa parlamentar, que não é um privilégio pessoal nem extensão da personalidade do parlamentar", opinou Fachin.
O outro elemento a ser observado é sobre o uso das redes sociais pelos políticos. A discussão sobre se a imunidade parlamentar abrangeria também as postagens na web é tão presente que, inclusive, foi inserida no projeto sobre as fake news que tramita no Congresso Nacional.
A base bolsonarista insiste que os comentários não devem cerceados, mesmo se contiverem ofensas ou ataques a quem quer que seja. Nesta perspectiva, muitos foram os que comemoraram quando da notícia da compra do Twitter pelo bilionário Elon Musk (na esperança de menos moderação de postagens).
O caso mais recente e mais polêmico sobre a discussão envolve o deputado bolsonarista Daniel Silveira, que recebeu perdão do presidente após ser condenado pelo STF e foi recebido em cerimônia no Palácio do Planalto, em defesa da liberdade de expressão.
O caso de Kajuru, em análise, é exatamente sobre redes sociais. Trata-se de seis queixas-crime movidas pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO) e pelo ex-deputado federal Alexandre Baldy. O senador foi julgado a partir de uma série de publicações contra Baldy e Vanderlan.
Neste sentido, coube o entendimento de que a imunidade parlamentar não deveria proteger Kajuru no episódio específico e, portanto, essa interpretação se estenderia ao uso das redes sociais. Para Gilmar Mendes, o instrumento não pode servir como um salvo-conduto para "abusos ou usos criminosos, fraudulentos ou ardilosos dessa prerrogativa para a ofensa a terceiros ou para incitar a prática de delitos".