Não foi à toa que o presidente da República, Jair Bolsonaro, se reuniu com personagens emblemáticos do establishment nos últimos dias. De Dias Toffoli a Rodrigo Maia, passando por Alcolumbe e Gilmar Mendes, os encontros expressam um movimento cada vez mais claro de sobrevivência política, intensificado após ver a família atingida por uma sequência de denúncias, de cheques a rachadinhas. Em seu segundo ano como presidente, o capitão deixa de lado o disfarce vestido na campanha e assume de vez sua entrada no jogo político.
Eleito com a bandeira de anti-tudo-que-está-aí, o "novo Bolsonaro" (sic) já não esconde que o perfil anterior não passava de personagem fictício, endeusado por milhões de eleitores. Curioso é que a ala que defende o capitão da moralidade chegou a personificar em Maia, Alcolumbre e no próprio Toffoli a insatisfação com o cenário político. No início do ano, manifestações do grupo (incentivadas por Bolsonaro) pediam fechamento do Congresso e atacavam figuras com as quais o presidente esteve reunido no fim de semana e nesta segunda-feira.
Bolsonaro pode parecer, mas de longe não é burro. Enquanto a discussão da ema e da cloroquina tomava conta das redes sociais, ele selou de vez aliança com centrão, demitiu líderes do PSL no Congresso para nomear velhas raposas (muitos investigados na Lava-Jato), distribuiu cargos para partidos fisiologistas e há poucos dias indicou o desembargador Kassio Nunes para a vaga que será aberta com a saída de Celso de Mello no STF - nome que ganhou aval até mesmo de Gilmar Mendes.
Como destacou Elio Gaspari, Mendes tinha hora marcada com Bolsonaro para um encontro no Palácio do Planalto na terça-feira. O presidente mudou o local do encontro para a casa do ministro, levando consigo o futuro colega. Política pura, senhoras e senhores. E justiça seja feita: modelo este que não foi inaugurado por Jair.
Interessante, nos próximos capítulos, será observar o quanto isso repercutirá sobre a imagem de Bolsonaro. Até aqui, o presidente surfa em popularidade principalmente por conta da concessão do auxílio emergencial, absolutamente necessário em meio à pandemia de coronavírus. Não sem sentido, o presidente corre contra o tempo para lançar um programa que substituirá o benefício, cujo fim está marcado para 31 de dezembro. Com transferência de renda aos mais pobres, o presidente garante que boa parte da população continue aplaudindo suas peripécias, independente de quem sejam seus novos amigos.