As sucessivas e assustadoras tentativas de esconder dados sobre o coronavírus por parte do Ministério da Saúde ganharam cartão vermelho do Supremo Tribunal Federal. Em decisão proferida na noite desta segunda-feira (9), o ministro Alexandre de Moraes precisou lembrar o presidente da República, Jair Bolsonaro, e seus subordinados de regras fundamentais referentes à administração pública. Ressaltou o ministro que é dever do governante "absoluta transparência" na condução dos "negócios públicos", num claro recado de que qualquer ato que desrespeite a regra é, sim, inconstitucional.
"A Administração Pública tem o dever de absoluta transparência na condução dos negócios públicos, sob pena de desrespeito aos artigos 37, caput e 5º, incisos XXXIII e LXXII, pois como destacado pelo Ministro CELSO DE MELLO, “o modelo político jurídico, plasmado na nova ordem constitucional, rejeita o poder que oculta e o poder que se oculta”", sublinhou.
As mensagens endereçadas ao governo Bolsonaro, que insiste em flertar com o obscurantismo, também podem ser lidos em outros trechos da decisão. Moraes, ao determinar a divulgação dos números sobre coronavírus, afirma que a pandemia coloca um desafio da "mais elevada gravidade" aos gestores e, como tal, "não pode ser minimizado". Em dado momento da crise, é bom lembrar, o presidente chegou a chamar a covid-19 de "gripezinha" e apelou ao seu "histórico de atleta" para dizer que não sofreria os efeitos colaterais da doença.
No despacho desta segunda-feira, Moraes alertou para para a possibilidade de "consequências desastrosas para a população".
"O desafio que a situação atual coloca à sociedade brasileira e às autoridades públicas é da mais elevada gravidade, e não pode ser minimizado, pois a pandemia de COVID-19 é uma ameaça real e gravíssima, que já produziu mais de 36.000 (trinta e seis) mil mortes no Brasil e, continuamente, vem extenuando a capacidade operacional do sistema público de saúde, com consequências desastrosas para a população, caso não sejam adotadas medidas de efetividade internacionalmente reconhecidas, dentre elas, a colheita, análise, armazenamento e divulgação de relevantes dados epidemiológicos necessários", observou.
Por fim, uma curiosidade: o ministro determinou que a Advocacia-Geral fosse intimada sobre a decisão inclusive via WhatsApp, dada a urgência da situação estabelecida no Brasil.
Desmerecer a pandemia, a essa altura do campeonato, beira a insanidade. Mas é preciso olhar além. O país amanheceu com 37 mil mortes pela doença e amarga a terceira posição no mundo em número de óbitos por coronavírus. Tentar esconder os números não é somente desonestidade ou mero ato tresloucado. É atentar contra a Constituição.