Não bastasse a trágica marca de terceiro país em número de mortes por coronavírus no mundo, o Brasil agora passa a competir com Coreia do Norte e Venezuela o título de país menos transparente quanto aos dados de casos registrados e óbitos pela doença. Nos últimos dias, o Ministério da Saúde protagonizou cenas de deixar boquiaberto qualquer cidadão com apreço pela transparência e pela democracia.
A começar pela decisão de alterar o horário de divulgação das estatísticas - tentando fugir da repercussão dos telejornais noturnos. Não funcionou. Ao sonegar informações no final da tarde, o governo aumentou a repercussão sobre o tema. Primeiro, um balanço é divulgado no noticiário com base em dados apurados pelas secretarias estaduais de Saúde. Depois, os números do governo federal ganham repercussão em boletim extraordinário de notícias.
Não parou por aí. Na sexta-feira, o Ministério da Saúde resolveu tirar do ar o site com dados sobre mortes e casos confirmados de coronavírus no Brasil. À colunista Bela Megale, do jornal O Globo, o ex-futuro secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Carlos Wizard, afirmou que os dados sobre coronavírus no Brasil eram "fantasiosos ou manipulados" e por isso promoveria recontagem. Não deu nem tempo. Caiu por si só antes mesmo de se sentar na cadeira, pedindo desculpas pelas declarações polêmicas.
O apreço pela escuridão chamou a atenção do presidente da Câmara, de ministros do STF e de órgãos que prezam pela transparência da decisão dos governantes eleitos pelo povo. A medida se aproxima de regimes autoritários e "deve ser rechaçada com veemência", denunciou a organização Transparência Internacional. A "manipulação de dados é manobra de regimes totalitários", completou Gilmar Mendes (STF): "o truque não vai isentar a responsabilidade pelo eventual genocídio", completou o ministro. "Brincar com a morte é perverso", disse Rodrigo Maia.
De fato, é preciso uma reação dura sobre a tentativa absurda de sonegar informações da população. Eleito em um regime democrático, Bolsonaro deve sim explicações ao seu país em meio a uma doença de alcance global. No mundo, como relatou o portal Uol, apenas a Coreia do Norte não informa as estatísticas da pandemia, enquanto a Venezuela, de Nicolas Maduro, divulga números subestimados sobre o alcance do vírus. Os brasileiros não merecem passar por mais esse vexame.