É uma revolução, sim, e é, também, um passo atrás (ou seria à frente?). Nativos da geração Z, formada por pessoas que nasceram de 1995 em diante, andam substituindo o smartphone, com todas as suas funcionalidades, pelo dumbphone. Em bom português, o celular burro.
Aquele mesmo que você está pensando: o velho Nokia-tijolinho, o Motorola do início dos anos 2000, o modelo flip (que abre e fecha). É o celular comum, sem navegação na internet, sem mídias sociais, sem os recursos “inteligentes” que nos mantêm paralisados diante da tela. Só funções básicas, para fazer e receber chamadas, mensagens de texto e programar alarmes. O máximo de entretenimento é o jogo da cobrinha.
Tem gente transferindo o número para os velhos aparelhos, mas também já têm marcas fabricando os tais telefones idiotas — e ganhando uma grana com isso. Precursora na fabricação dos celulares basicões, a Nokia, da HMD Global, tem inclusive uma linha novíssima (rá!) cujo slogan é “Dumb phone, smart choice”, algo como “telefone burro, escolha inteligente”.
Estar/ser “offline” é o novo “cool”, como já sentenciou a plataforma The Summer Hunter, especialista em detectar tendências. Há, também, uma certa admiração pela estética do passado.
É curioso pensar isso, quando temos uma geração que já cresceu praticamente sem saber como era a vida antes dos smartphones — lembre-se de que Steve Jobs apresentou o iPhone ao mundo em 2007, ou seja, há 17 anos. É essa turma que, agora, resolveu fazer o tal “detox digital neo-ludita”, fugindo desesperadamente das pressões das redes sociais e do uso compulsivo dos dispositivos, que tiram o foco e a saúde mental.
Você já se deu conta de como essa tecnologia é íntima (está sempre nos nossos bolsos, perto dos nossos rostos, junto aos nossos corpos)? Não é à toa que venha deixando cada vez mais distraídos e até doentes.
Estudiosos têm apontado, com alguma certeza, que essa tecnologia pode viciar tanto quanto cocaína. É o caso da psiquiatra norte-americana Anna Lembke, autora de livros como os best-sellers Nação Dopamina e Nação Tarja Preta. Ela esteve em Porto Alegre nesta semana para falar no Fronteiras do Pensamento. Foi uma aula. A professora de Stanford é categórica: as mídias digitais são ferramentas importantes, mas também “drogas muito potentes”.
Para ela, vivemos um “paradoxo da abundância”. Queremos sempre mais (estímulos, produtividade, consumo. “likes”) e nunca estamos satisfeitos. Mas como restaurar o equilíbrio perdido?
Anna não chega a ser tão radical quando a turma dos dumbphones, mas propõe um jejum de 30 dias das fontes de prazer imediato, incluindo eles, os smartphones.
Você seria capaz?