É como naqueles comerciais com cenas perfeitas: alguns influenciadores digitais estão sempre sorrindo, com suas belas e reluzentes arcadas dentárias à mostra. Capricham na maquiagem (ou no filtro do celular) para esconder as imperfeições. Transbordam confiança e autoestima. Acima de tudo, cultivam centenas, milhares seguidores, para os quais produzem conteúdo diário nas redes sociais.
Precisam engajar.
Desde que o acesso à internet se disseminou, o que começou de forma despretensiosa virou profissão, e o marketing de influência se tornou fundamental na estratégia de venda das marcas. É um negócio que movimenta bilhões de dólares no mundo.
O Brasil - onde já há mais smartphones do que gente - é um dos países com o maior número de pessoas exercendo esse papel: em 2022, segundo um levantamento da Nielsen, empresa especializada em mensuração e análise de dados, havia cerca de 500 mil influenciadores brasileiros com pelo menos 10 mil seguidores cada. Fora o resto.
Não sei se você já se deu conta disso, mas grandes empresas e agências de propaganda criaram setores específicos para atuar junto desses profissionais. Já existe até curso de formação na área.
Ser criador de conteúdo virou um sonho de consumo, e é fácil entender por quê.
Quem não gostaria de ser como aquelas pessoas charmosas, glamourosas e invariavelmente felizes que vemos na tela do telefone, ganhando “mimos”, ditando estilos de vida e apontando tendências?
Já pensou no poder de quem consegue atingir a marca de 10, 20, 30 milhões de seguidores? Ou será que é apenas uma ilusão?
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“Desinfluencers: novo perfil nas redes dispensa luxo e traz vida como ela é”.
“Esqueça os influenciadores digitais, vêm aí os ‘desinfluenciadores’; entenda”.
“Desinfluencers: movimento faz sucesso no TikTok com resenhas ‘sinceronas’ e críticas ao consumismo exagerado”.
Se você jogar o termo “desinfluencer” no Google, vai encontrar as manchetes acima e descobrir que existe uma nova turma em ação, falando mais ou menos assim:
— Veja, nós somos sinceros com você. Nós não te enganamos!
Sabe o que eles/elas fazem? Dizem “não compre isso”, "cuidado", “não acredite no que te induziram a fazer”. No fundo, são novos influenciadores sugerindo que você deixe de se inspirar nos “antigos” para ser persuadido por eles: os “do contra”. E a roda segue girando.
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É difícil, nesse mundo que a gente vê na tela do telefone, reconhecer o que de fato é autêntico. Por quem, afinal, queremos ser influenciados? Aliás, almejamos isso?
A vida anda correndo tanto que não há tempo para pensar.
Talvez Umberto Eco estivesse certo quando concluiu que as redes sociais “deram voz a uma legião de imbecis”. Talvez sim, talvez não. Tem muita gente criando coisas legais nas redes, com qualidade e velocidade nunca vistas.
Há alguns anos, ficávamos sabendo das novidades com meses de atraso. Isso mudou para melhor. Nem tudo está perdido, afinal. Na dúvida, não esqueça: é só dar “unfollow” e um “tchauzinho”. O controle sobre quem nos influencia (ainda) é nosso.