A recente escalada da intolerância no Brasil, com episódios de violência inaceitáveis - como o assassinato do guarda municipal Marcelo de Arruda, em Foz do Iguaçu (PR), simplesmente porque o autor, bolsonarista, discordava da posição política da vítima, lulista -, faz pensar. O que aconteceu conosco?
Há alguns anos, o brasileiro se orgulhava da fama de “boa praça”. Era um povo que se vendia ao mundo como “amigável”, “aberto”, “pacífico”, "tolerante", "avesso a conflitos". A verdade é que a suposta cordialidade nacional sempre foi um mito. E hoje, mais do que nunca, está em xeque.
A discussão vem de longe. Há muito o tema figura nas análises de intelectuais brasileiros - basta ler o clássico Raízes do Brasil, publicado em 1930 por Sérgio Buarque de Hollanda, que cunhou o termo "homem cordial".
O que mudou, desde então? A agressividade se tornou mais visível e até motivo de ostentação. Vem ganhando terreno com a ascensão do bolsonarismo e o recrudescimento dos embates políticos, tendo o lulismo no polo oposto.
A intolerância - que sempre existiu - era, de certa forma, mascarada. Hoje, há pessoas que se orgulham de assumir em público pendores autoritários. Não aceitam o diferente. Não estão mais dispostas a dialogar.
Em 2019, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz, professora titular da Universidade de São Paulo (USP) e visitante em Princeton, nos Estados Unidos, tratou desse fenômeno em um livro chamado Sobre o autoritarismo brasileiro. Os subterrâneos da história do Brasil - com toda a carga do colonialismo e da herança perversa da escravidão - ajudam a entender porque fomos e continuamos a ser uma nação mais excludente do que inclusiva.
Mas isso não é motivo para omissão. Precisamos reagir como sociedade e rápido. Ou teremos mais mortes por sectarismo pela frente e uma das eleições mais virulentas da trajetória política recente do país.