O tal “sertanejo universitário”, repetitivo e de mau gosto, pode liderar as paradas mas (ainda) não conseguiu matar o sertanejo raiz, pautado pela viola caipira e pelo sentimento telúrico que sobrevive principalmente nos interiores de São Paulo e Minas Gerais. Provas são dois discos recentemente lançados, O Poeta e o Violeiro, de Zé Geraldo & Francis Rosa, e Sobre Pedras e Girassóis, de Noel Andrade. Vozes da natureza que se manifestam, conscientes do mundo em que vivem.
O mineiro Zé Geraldo não há quem não conheça, tem 40 anos de estrada e 19 álbuns. Paulista da Serra da Mantiqueira, Francis já gravou 10 discos e é tido como um dos grandes da viola hoje. Juntos, já lançaram um DVD em 2018. Em O Poeta e o Violeiro cantam em solo e em duo, deles e outros autores, canções que valorizam as letras como Meio Matuto, Meu Cão Amigo, O Canto do Pensamento e Lembranças da Roça. Os arranjos incluem violão, teclados, acordeom, baixo e percussão, mais convidados como Ricardo Vignini. As vozes combinam, as letras dizem, a sonoridade é múltipla, o resultado é muito bonito.
Também nascido no interior paulista, o violeiro Noel Andrade é da nova geração e chega ao terceiro disco. Assim como Zé Geraldo, um ótimo intérprete mesclando moda de viola e, digamos, rock rural. Suas músicas, a maioria em parceria com Flávio Murilo, contam histórias daquele ambiente – mas não são saudosistas, pois o tempo deles é hoje, como mostram em A Ciranda do Infinito. De outros autores, dois grandes sucessos: Casa no Campo (Zé Rodrix/Tavito) e Nuvem Passageira (Hermes Aquino). Além da viola, tem violão e baixo, com acréscimos aqui e ali de acordeom e rabeca. E a participação de Zeca Baleiro.
Riqueza instrumental brasileira
Jorge Helder – Caroá
Um dos contrabaixistas mais requisitados da MPB, cerca de 350 gravações no currículo (com Chico, por exemplo, toca desde 1993), o cearense Helder, 60 anos, 40 de carreira, faz o segundo álbum solo. É jazz brasileiro com variações, a partir do piano de Hélio Alves, a guitarra de Chico Pinheiro e a bateria de Tutty Moreno.
Fluente, o quarteto não economiza nos improvisos, levando a sonoridade mais para climas harmônicos do que para cores melódicas. Começa com baião, dialoga com o samba, namora o bolero. Helder finge ter letras com os vocalizes de Mônica Salmaso, Sérgio Santos e Zé Renato. Para ouvir com calma. Biscoito Fino, CD R$ 47
Antonio Adolfo – Octet and Originals
Seguindo o projeto de lançar um disco por ano, depois de dedicar álbuns a Tom Jobim e Milton Nascimento, o pianista, compositor e arranjador carioca, que vive entre o Brasil e os EUA, se volta para a própria obra.
À frente do octeto que, entre outros, tem o acima citado Jorge Helder, Jessé Sadoc (trompete) e Ricardo Silveira (guitarra), AA se diverte. Seu som é o próprio brazilian jazz, com arranjos destacando o ótimo naipe de sopros.
Os clássicos Sá Marina e Teletema já valem o disco, mas tem as não menos Heart of Brazil, Boogie Baião, Zambumbaia. E pensar que AA está em ação há 60 anos! AAM Musica, CD R$ 40
Waldir Azevedo – O Mestre do Cavaquinho
Gravado originalmente em 2000, na comemoração dos 50 anos dos clássicos Brasileirinho e Delicado, este álbum chega às plataformas digitais para marcar os cem anos de nascimento do compositor carioca (1923-1980).
Outro bamba, o bandolinista Déo Rian, segue os arranjos originais com um grupo de cavaquinho, violão sete cordas e pandeiro. Waldir foi/é um dos maiores nomes da história do choro, deixou mais de 160 composições. Além das citadas, Déo escolheu outras 15 para o disco, entre elas Pedacinhos do Céu, Vê se Gostas, Sobe e Desce, Cinema Mudo e Flor do Cerrado.
Bom demais de ouvir. Biscoito Fino