A Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) de 2022 promete ser umas das melhores dos últimos tempos. Após dois anos seguidos sem edição presencial, o evento retoma as atividades na histórica cidade de Paraty. Com uma nova curadoria composta por Fernanda Bastos, poeta, jornalista e fundadora da editora Figura de Linguagem; Milena Britto, professora na Universidade Federal da Bahia e pesquisadora em Políticas Públicas; e o pesquisador Pedro Meira Monteiro, professor da Universidade Princeton e um dos fundadores do Brazil LAB (Luso-Afro-Brazilian Studies), a Flip se renova e pode trazer uma nova perspectiva de eventos literários desse porte no país.
Ainda sob a curadoria de Fernanda Diamant, em 2019, a Flip sofreu críticas contundentes ao anunciar como homenageada a escritora estadunidense Elizabeth Bishop. Em algumas horas, a internet trouxe uma série de frases e declarações polêmicas da poeta que morou no Brasil e que criou uma relação mais próxima com o país. Em correspondências a amigos, Bishop faz críticas preconceituosas à cultura e aos costumes brasileiros, incluindo elogios ao golpe de 64. Agora, passados dois anos do anúncio da homenagem (que depois foi retirada) e de uma trágica pandemia, temos o nome de Maria Firmina dos Reis como homenageada.
Maria Firmina, mulher negra, nascida no Maranhão, constrói em Úrsula uma narrativa romântica para falar das violências sociais oriundas da escravidão. O livro gira em torno de Tancredo e Úrsula, dois jovens, puros e sonhadores. Ambas as personagens têm a vida marcada por perdas e decepções familiares. Logo eles se apaixonam. Entretanto, ao logo da narrativa, eles se deparam com algumas barreiras para concretizar seu amor.
A história tem um ritmo novelesco bastante romântico, gênero muito comum no século 19, mas que ao mesmo tempo traz uma abordagem crítica à escravidão. Úrsula é um dos primeiros romances brasileiros de autoria feminina, datado de 1859. O romance dá voz e protagonismo a personagens escravizados e é visto como a obra inaugural da literatura afro-brasileira.
Além disso, o livro traz também a representação de homens autoritários, dando um panorama contundente sobre o sistema patriarcal e senhorial da época. De fato, a curadoria da Flip acertou na escolha de Maria Firmina, não só por sua qualidade enquanto escritora mas também porque demonstra uma maturidade curatorial, além de aproximar o público e o mercado editorial de outras narrativas que historicamente foram excluídas e silenciadas.
Essa Flip promete!