A jornalista Bruna Oliveira colabora com a colunista Gisele Loeblein, titular deste espaço.
Há mais de 20 anos, a paixão pelos cavalos fez com que um hobby virasse a atividade principal do criador e domador Odilon Camargo Júnior. Em família, ele construiu um Centro Equestre em Guaíba, na região Metropolitana da Capital, onde doma cavalos para terceiros, dá cursos e aulas de equitação. Mais do que isso, se preocupa em levar adiante uma tradição de cuidado e amor aos animais. Com uma lista extensa de prêmios na garupa, se orgulha de ver que o apreço pela raça está sendo passado também para os seus filhos.
— O cavalo é um animal que dá muito retorno emocional, da convivência mesmo. Eu digo que trabalho no meu paraíso — resume.
Na entrevista a seguir, conheça a trajetória e o trabalho do profissional:
Como é o trabalho de um domador de cavalos?
Trabalhamos desde o potrinho, que é o cavalo recém-nascido. Começamos com o manejo do potro que está junto à mãe e a colocação do buçal (arreio que vai do pescoço à cabeça), para cabrestear ele. A partir de dois anos e meio, quando já está com uma formação óssea bacana, é que começamos a parte da doma. Fazemos uma mistura da doma tradicional com a doma racional. Antes de colocar qualquer embocadura na boca, fazemos todo o manejo de aceitar os arreios, de amansar o domínio das patas e então poder casquear o cavalo. Quando vai montar no cavalo, ele já está praticamente domado, manso de arreio, como chamamos. Daí em diante, em questão de meses o cavalo está se governando de um lado para o outro e já podemos dizer que está domado.
Qual a diferença entre doma tradicional e doma racional?
A doma tradicional é mais a parte da embocadura. O pessoal fala muito em quebrar queixo, mas não tem nada disso, não quebra o queixo. Usa-se um couro, o bocal, que é para sujeitar o cavalo a alguns movimentos. E na doma racional não usa bocal, só outros tipos de embocadura. A doma racional trabalha mais o flexionamento do animal.
Como aprendeu essas técnicas?
Nós tínhamos cavalo de competição, eu e a minha esposa, e tínhamos aquela curiosidade de aprender. Fazíamos curso de doma racional e doma tradicional, mas para os nossos cavalos. Tínhamos outras profissões, eu na área financeira e ela advogada, e começamos a ter um hobby nosso, que era o cavalo. Com a função de termos bons resultados, queríamos dar qualidade de vida para os nossos filhos, e então resolvemos adquirir um campo e abrir um centro de treinamento (o Referencial Centro Equestre, em Guaíba). Já faz 22 anos. E hoje é isso: eu domo e treino os cavalos para terceiros. Também temos aula de equitação e o meu filho também já doma junto comigo.
Quanto tempo leva a doma de um cavalo?
É um processo longo. Às vezes, o cliente nos manda um cavalo de três ou quatro anos que nunca viu gente. O trabalho que começa com os potros é muito mais fácil porque tem todo o manejo conosco. Nos cavalos que vêm de clientes, em torno de seis ou sete meses o animal está pronto. Claro, se não for muito arredio e muito bravo. Cavalo é um bicho muito inteligente e trabalhamos na base da confiança. Normalmente, entre seis e oito meses estamos entregando um cavalo domado. Domamos muitos cavalos para crianças e também pessoas de mais idade, então sempre procuramos ter o cavalo com o máximo de mansidão e confiável. Mas é um ser vivo. Um indivíduo, como eu digo... uns muito rapidamente mostram o aprendizado e outros levam um pouco mais de tempo.
Como você descreve a relação do homem com o cavalo, essa confiança que se cria?
O cavalo é um animal que dá muito retorno emocional, da convivência mesmo. Eu digo que trabalho no meu paraíso. Fomos atrás disso, que era o bem-estar nosso e dos nossos filhos, e de trabalhar com o cavalo, que eu amo. É o nosso ganha-pão e sou realizado por isso. Temos um trabalho às quartas-feiras para uma empresa de Porto Alegre que faz equoterapia e nós disponibilizamos os cavalos. Aí a gente vê o quanto é gratificante. Junto da minha família, o cavalo é a vida da gente.
Com quais raças você trabalha?
Fomos criados e trabalhamos a vida inteira com cavalo árabe. Somos muito vinculados pelo fato que de corríamos provas, eu e a minha esposa, com cavalos da raça. A maioria dos nossos 62 cavalos no Centro Equestre são árabes. Mas trabalhamos com todas as raças, como também cavalo crioulo e quarto de milha.
Que habilidades um domador de cavalos precisa ter?
Primeira coisa, gostar muito de cavalo. Não ter medo ou receio, porque o cavalo, por mais que seja manso e inteligente, tem reações em relação ao tipo de manejo. Outra coisa que sempre aconselho é que faça cursos e aprenda com pessoas que têm experiência com cavalo. Mas, sinceramente, também acho que existe um dom. Pessoalmente, tem coisas que tento passar para o meu filho ou o pessoal que trabalha comigo e não consigo, mas sei executar. É uma vocação que é da gente.
Quando foi o seu primeiro contato com um cavalo? Foi quando eu era muito pequeno. Meu pai era coronel da Brigada Militar e sempre gostou muito de cavalo e de hipismo. Voltei mesmo a lidar com cavalo quando conheci minha esposa, 30 anos atrás, porque o meu sogro criava. Então começaram as provas e passamos a nos envolver com cavalo como um hobby. E caminhou até chegar ao sonho de abrir o nosso centro de treinamento.
Você coleciona alguns títulos no currículo. Considera algum mais especial?
Todos são importantes porque são “peleados” de se conquistar. Acho que o que tenho mais apreço é o título nacional de campeão de Cavalo de Ouro que conquistei entre 176 competidores. Era uma égua de minha criação e de minha doma, então é um carinho especial.
E tem algum animal que seja o seu preferido?
Teve, porque na realidade já a perdemos. Foi essa égua que ganhei o campeonato, que desde potrinho eu manejei, domei e treinei e os meus dois filhos aprenderam a andar e a correr prova nela, a Prates Raíssa. Essa eu digo que botou o leite dentro de casa, o pãozinho da turma (risos)... ganhou muita coisa e vai ser sempre o xodó. Tive ela por 16 anos.
O que gostaria de deixar de legado ou ainda gostaria de conquistar?
O maior legado já conseguimos deixar, que é o amor dos filhos pelo cavalo. Os dois competem e já tiveram inúmeras premiações também. Quando estamos lá fora na propriedade eles estão junto, então digo para a minha esposa: acho que atingimos o objetivo que a gente sonhou, que era dar qualidade de vida aos nossos filhos e ter eles próximos através do profissional e do hobby. Passar adiante a tradição e o amor pelo cavalo, que para nós é tão importante.