
Nasci e cresci em Porto Alegre, essa cidade que a gente ama e odeia num ritmo meio cardíaco: segunda, quarta e sexta ela nos tira do sério, terça, quinta e sábado a gente jura que é a melhor cidade do mundo, e domingo a gente assa uma costela e esquece de reclamar. Eu moro em São Paulo há 17 anos, mas Porto Alegre ainda me tem pela barriga: ninguém no mundo me tira o gosto do lombinho do Barranco, do galeto do Komka, do rigatoni do Copacabana ou da torta de sorvete que é mais patrimônio da cidade que o Laçador.
Mas amar uma cidade é também se doer por ela. E Porto Alegre tem doído — meio malcuidada, meio largada, como se quem deveria amar tivesse desistido. Que o novo ciclo que começa hoje traga menos descaso e mais cuidado. A capital dos gaúchos merece mais do que saudade e memória gustativa.
Agora, falando em abandono, o que não faltou no STF ontem foi gente se distanciando. Começou o julgamento da denúncia contra Bolsonaro e o que se viu foi um racha entre os próprios acusados. Cada um por si: um acusando o outro de mentiroso, outro dizendo que nem sabia que tinha reunião nenhuma, e até advogado alegando que o cliente falou besteira porque “tá velhinho”. Teve de tudo.
Bolsonaro apareceu no Supremo, coisa raríssima. Posou de estadista depois que o filho Eduardo se auto-exilou nos Estados Unidos, como se dissesse: “estou aqui, à disposição da Justiça”, ignorando o detalhe de que não estar também não era uma opção. Mas é o gesto que conta, né? Especialmente para o Supremo, que anda meio descorado.
O fato é que o julgamento correu num ritmo que não é comum no Supremo. Terminou 40 minutos antes do previsto. E olha que no Brasil tudo costuma atrasar — menos esse processo. Parece que o roteiro já tá escrito e que todo mundo já sabe onde vai dar.
E aí vem o dilema: até quando os fiéis bolsonaristas manterão a fé? Porque essa semana ele mesmo, o ex-presidente, jogou a Zambelli aos leões. Fez vista grossa, se afastou, como quem diz: “Se vira”. Não é bem a atitude de um comandante que lidera tropas com honra até o fim.