O governo federal está preso em um dilema vazio entre ambientalismo e desenvolvimento, e a maior evidência deste obscurantismo é a recusa do Ibama em permitir à Petrobras a realização de pesquisas para exploração de uma riqueza trilionária que jaz sob as águas da chamada “Margem Equatorial” brasileira. Ali, numa área que se estende do Rio Grande do Norte ao Amapá, repousam exuberantes jazidas de petróleo que, em estimativas conservadoras, podem render mais de 10 bilhões de barris, quase um novo pré-sal. Para se ter uma ideia do que está em jogo, o Brasil dispõe de 15 bilhões de barris. Como desdenhar destes quase 11 bilhões de barris adicionais? Nenhuma nação, por mais rica que seja, cometeria tamanho desatino. Mas o Brasil parece empenhado em mostrar ao mundo que é um caso único de autossabotagem.
Nas pesquisas realmente relevantes, a nova direção do Ibama fincou pé. Alega inconsistências técnicas para barrar as tentativas da Petrobras de realizar os estudos de viabilidade. Vê risco de contaminação ambiental em caso de vazamento de petróleo a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas. Sua intransigência recebe o aval de Marina Silva, a ministra do Meio Ambiente que pensa e age como se fosse uma ilha. Se o Brasil é um país de renda per capita modesta, estagnada há décadas, Marina parece não ligar. Se índios, caboclos e grande parte dos amazônidas vivem em condições ainda piores que as dos brasileiros mais pobres, Marina dá de ombros e continua a emitir platitudes que só juvenilizam o debate sobre economia e meio ambiente, natureza e gente. Está nítido que o ser humano não entra na equação de Marina como uma prioridade, mas como uma alegoria. A Amazônia vira, assim, um santuário fechado ao Estado brasileiro – mas não às ONGs, cujas ligações com interesses estranhos aos do Brasil passam, em boa hora, pelo crivo de uma CPI no Senado.
Lula, que em campanha disse e desdisse o que pensava sobre temas cruciais para não perder votos, explicita no governo sua ambivalência. Prometeu cuidar de necessidades imediatas do povo brasileiro, demandas que são para já, mas os compromissos que assume na esfera climática parecem compatíveis com a realidade dos países que visita no primeiro mundo – nos quais as carências básicas da população já foram atendidas, como o oferecimento de redes de água e de esgoto e a erradicação de subabitações. Sobre tais chagas sociais, estas sim denunciadoras de um modelo incompatível com a apregoada bandeira da sustentabilidade, nada se viu do governo atual. Aliás, registre-se que tentou enterrar o marco legal do saneamento, o que implicaria sepultar a última chance de livrar o país de uma corrente de atraso, uma fábrica de doenças, que atravessa séculos.
Ao bancar Marina e um Ibama fundamentalista no caminho da Petrobras, o que Lula faz é adular a corte do ESG global (tema para um outro artigo), talvez mirando uma futura posição na ONU. Vaidade que custará caro ao Brasil. A descarbonização da economia de um país com um passivo social gigantesco, como o Brasil, não deveria ocorrer no estilo cavalo-de-pau. Seu partido, que começa um quinto mandato na condução do país, já deveria saber que a conta virá – e pesará sobre os mais humildes, aqueles que diz defender e dos quais se afasta cada vez mais.