A luta contra o racismo é inadiável, irrefreável e imprescindível. A luta contra o racismo é compulsória, urgente e obrigatória. Mas a luta contra o racismo precisa ser travada com conhecimento e informação. Afinal, desconhecimento e desinformação estão na base do preconceito e, portanto, do racismo. Não podem, justo por isso, fazer parte da luta contra ele.
Essa semana algumas empresas alardearam – e com pitada de orgulho que só faz aumentar o constrangimento – que não usarão mais a expressão "Black Friday" para definir o dia consagrado ao consumismo desenfreado. A decisão foi tomada em função da suposta origem racista do termo. Trata-se não só de uma ilação patética, mas de uma falácia, de pura fake news, de uma ode ao desconhecimento e ao preconceito. Embora tais empresas possam ter agido com boas intenções – daquele tipo que enche o inferno –, não dá para descartar (não a priori), a hipótese de que, no fundo, estejam dispostas a surfar na onda antirracista e se aproveitarem dela. De outro modo, por que ajudariam a propagar notícia falsa sem antes averiguá-la?
Existem várias hipóteses – pelo menos quatro – para o surgimento da Black Friday e nenhuma delas tem absolutamente nada a ver com a raça negra, com escravos, com racismo. A mais provável está ligada à polícia da Filadélfia que, além de ter que lidar com as liquidações bombásticas promovidas pelas grandes lojas de departamentos logo após o Dia de Ação de Graças, ainda tinha que controlar as multidões que acorriam ao Gre-Nal dos Gre-Nais: o jogo de futebol americano do Exército contra a Marinha.
Os puristas da língua de Camões bem poderiam argumentar que fundamental mesmo seria traduzir o termo (até porque quem tem "liquidação" não precisa de "sale", né?). Só que aí surgiria a sexta-feira negra. E não ia funcionar, pois além de a sexta-feira negra ser a sexta-feira 13, de mau agouro, também iria acender a questão da suposta (e, de novo, ridícula) insinuação racista. E tais linguistas iam acabar virando ovelhas negras em certos círculos (lembrando que "ovelhas negras" existem na natureza; só não sei de quem é a culpa pelo fato de sua lã ser de qualidade inferior ao do resto do rebanho).
A luta contra o racismo – inadiável, irrefreável e imprescindível; compulsória, urgente e obrigatória – tem que ser travada com pensamentos, palavras e atos. Mas atacar, banir ou demonizar palavras como "negro" e "preto" (e mesmo "mulato") não só não vai acabar com o racismo como caminha na direção oposta: reforça-o. Por fim, no caso específico da Black Friday, cabe lembrar que ela interessa mesmo é ao sacrossanto mercado. E para mercado só existe uma cor: a cor do dinheiro.