Quando tinha quatro anos, olhei para o alto e perguntei:
– Mãe, que dia eu nasci?
– Em 30 de maio, meu filho.
– Bah, mãe, bem no dia do meu aniversário!
Daquele momento em diante, estarrecido diante da espantosa coincidência de ter nascido bem no dia do meu aniversário, decidi que faria deles todos uma festa. Meu aniversário de 5 anos, passei-o num prédio cinzento no coração de São Paulo. A família estava lá, aguardando a reforma da casa onde iríamos morar. Mas como passei-o com minha namorada de infância e fugimos daquela festa chata para apertar em todas as campainhas do 11º ao 17º andar, voltando recobertos de fuligem, para mim foi um folguedo.
No meu aniversário de 10 anos, eu já estava de volta a Porto Alegre e minha mãe, “influenciadora” avant la lettre, armou uma festa que marcou época, com mágico, mini-snooker e mesa de pingue-pongue, até então impensáveis na cidade. Só que ela decorou a mesa com frutas de cera – e elas amanheceram cheias de dentadas. A namorada de infância estava lá, mas quem mordeu a maçã do amor fui eu.
No dia dos meus 15 anos, decidi que não queria mais ser virgem. Então, me dirigi a um bordel, apropriadamente chamado Sucata (na “lomba do cemitério”). Bati na porta mais hesitante do que excitado. Madame Min atendeu e disse: “Sim?”. Eu disse “não” e adiei meu debut. Passei meu aniversário com uns amigos e minha namorada de infância foi a única menina que apareceu lá – só que não era mais minha namorada.
Meus 20 anos, passei-os na Argentina, cobrindo a Copa do Mundo por ZH. Mas achava que era careta demais festejar aniversário. E como ganhara uma medalha por ser o mais jovem repórter da história das Copas, me dei por satisfeito. Meus 21 anos, passei-os nas ruínas de Palenque, no México. Lembro que o cardápio foi sopa de cogumelo, mas depois de eu, um escriba maia, ser decapitado por um soldado espanhol que invadiu o baile, esqueci do resto. Meus 30 anos, passei-os na comunidade em que havia morado com minha namorada de infância, mas ela já tinha ido embora. Não sabe o que perdeu.
Achei que meus 40 anos seriam uma festa de arromba. Mas estava duro e passei-os numa pizzaria onde aniversariante não pagava. Meus 50 anos deveriam ser um kerb, mas eu votara a ser duro, após ter feito meu primeiro milhão, e passei-os sob a cerração, nos Campos de Cima da Serra. Mas meus 60 anos, passei-os na casa em que Bob Dylan havia vivido em Woodstock. A casa agora é de uma amiga de uma amiga – e pela bagatela de US$ 1.500 a noite, eu a aluguei, apesar de estar duro.
Meus 62 anos, vou passa-los em confinamento. Mas como, por incrível coincidência, a data vai cair bem no dia em que nasci e quando se completam exatos 62 dias que estou em casa, farei uma grande festa a três. Mesmo estando meio duro.