Desfrutei, certa vez, do inenarrável prazer de assistir uma palestra do escritor Gore Vidal (1925-2012). Dentre outras preciosidades, assegurou ele que qualquer história, por mais complexa que seja, pode ser resumida numa só frase. "Sujeito pensa que é Deus, junta mais 12 e morre no fim."Sentenciou, sem esboçar sorriso.
Tão instigante e rica em potencialidades julguei ser aquela storyline que, desde então, venho pensando em enviá-la para a Ancine na ardente expectativa de obter financiamento e realizar um épico cinematográfico baseado nos dramáticos eventos comprimidos naquelas (coincidentemente) 12 palavras. E agora que a agência de fomento ao cinema brasileiro virá a ser ocupada por alguém "terrivelmente evangélico, com a Bíblia debaixo do braço, o joelho ralado de ajoelhar no milho e que saiba 200 versículos de cor", creio que minha proposta tem grandes chances de aprovação.
Eu já havia pensado em emplacar um roteiro baseado na velha piada de Woody Allen: "Só mesmo uma mãe judia para convencer o filho de que ele é Deus e ela é virgem". Mas Woody anda em baixa e acredito que a piada não seria páreo para o projeto que meu amigo, o cineasta, professor, baterista e replicante Carlos Gerbase pensa em apresentar para a mesma Ancine, conforme ele próprio revelou nas páginas da minha, da sua, da nossa (e da dele) Zero Hora. Gerbase quer filmar a história de Ló, ambientada em Sodoma (ah, esse nome soa como música para mim) e, a seguir, na caverna onde suas duas filhas abusam dele. Tudo, é claro, conforme a Bíblia, que Gerbase, segundo dizem, também anda carregando sob o braço.
Mas sei, de fonte segura, que, além de Gerbase, enfrentarei mais concorrentes se quiser mamar nas tetas do governo. Por isso, penso em adaptar a história de São Paulo (não a cidade, o apóstolo) para nossos tempos. No início do filme, Saulo (seu nome original, antes do acidente, ops, da conversão) ainda é criança. Ele está sendo levado para o colégio por seus pais, que amam o rosário, são contra a doutrinação nas escolas, não gostam de radares de trânsito e acham dispensável levar o rebento na cadeirinha. Ocorre um acidente e o pequeno Saulo é projetado pela janela do veículo. Ele bate com a cabeça no chão e... ilumina-se! Aí, vira evangélico, rala o joelho no milho e, numa admirável guinada metalinguística do destino (e do roteiro), assume a direção da Ancine!
Se eu não ganhar com uma sinopse dessas, é marmelada. Ou vão entregar o pão de ló para o Gerbase?