Já digo o título do livro sobre o qual quero escrever. Já digo. Mas, antes, permita-me uma consideração sobre Olavo de Carvalho, que morreu nesta terça-feira, provavelmente de covid. Não gostava dele, não gostava de suas ideias, não gostava de seu modo de agir. Ele era vulgar, grosseiro, mal-educado e muitas vezes equivocado, mas...
Esse “mas” é fundamental.
Mas Olavo de Carvalho conseguiu influenciar “de fato” uma parcela do país, e não uma parcela pequena.
Pegue o cerne ideológico do bolsonarismo, gente como Ernesto Araújo, Alan dos Santos, Felipe Martins, Ricardo Vélez Rodriguez, os irmãos Weintraub, Bia Kicis, Carla Zambelli, Sara Winter e o gaúcho Marcel van Hatten. Todos são olavistas. Ou olavetes, como ele dizia. Ou seja: o bolsonarismo é filho do olavismo. Bolsonaro é muito menor do que o movimento que o elegeu.
É o contrário de Lula. Lula se tornou maior do que o PT. Aquele velho partido criado no final da ditadura militar, com sólidos líderes intelectuais e sindicais, como Olívio e Tarso, aquele partido não existe mais. A figura de Lula cresceu tanto que submeteu o partido a sua vontade. O PT está para Lula como o PDT estava para Brizola.
Bolsonaro não tem essa força. Ainda que ele represente uma parte da população brasileira, ele é menor do que o movimento que o elegeu. Olavo de Carvalho deu sustentação intelectual a esse movimento. As ideias e o modus operandi são criações dele.
Quando Weintraub assumiu o Ministério da Educação, surgiram vídeos de uma palestra em que ele dizia mais ou menos assim para a plateia:
— Numa discussão com um comunista, faça como recomenda o professor Olavo: xingue, insulte, ofenda!
O próprio Olavo fazia assim. Eu o entrevistei, em 2018, logo após a vitória de Bolsonaro. O processo de negociação da entrevista e a conversa que tivemos mostraram um homem mais do que afirmativo, agressivo. Olavo era um tipo cheio de certezas. Podia proclamar uma maluquice, como aquilo de que as músicas dos Beatles foram compostas por Adorno, que parecia verdade devido à ênfase com a qual fazia a afirmação e à sustentação teórica repleta de referências filosóficas.
Foram precisamente essas características, a ênfase e a sustentação teórica aparentemente rica, que o tornaram sucesso na internet. Foi ali que Olavo cevou a nova direita brasileira. Foi algo que nunca aconteceu antes no Brasil: nos desvãos sombrios da internet, um movimento cresceu, tomou forma e, quase de surpresa, acabou elegendo o presidente da República. Bolsonaro existe por causa de Olavo.
Então, ele teve sua importância. Por isso, vou ter que deixar a indicação de livro para a próxima crônica. Mas da próxima não passa!